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sexta-feira, fevereiro 22, 2008

Evangelização da Juventude

* O que estiver desta forma e cor são comentários ou referencias no rodapé de cada página.




APRESENTAÇÃO


A evangelização da juventude foi tema central da 44a. Assembléia Geral da CNBB, realizada em Itaici, SP, de 9 a 17 de maio de 2006. O tema foi preparado por uma Comissão, que ouviu as organizações eclesiais que trabalham com a juventude e consultou peritos. Na Assembléia, o texto preparado foi discutido pelos bispos, recebendo numerosas observações e emendas, oportunamente integradas pela Comissão responsável na versão presente, que agora tenho a satisfação de apresentar.
Como não podia deixar de ser, a evangelização da juventude interessa muito à Igreja e aos seus Pastores, pois disso dependem o futuro da própria Igreja e também os rumos que a sociedade irá tomar. Os futuros responsáveis pela Igreja e a sociedade encontram-se entre os adolescentes e os jovens dos nossos dias.
Mas não é só por isso. O motivo principal é que os jovens têm o direito de receber da Igreja o Evangelho e de ser introduzidos na experiência religiosa, no encontro com Deus e no contato com as riquezas da fé cristã. E os Pastores da Igreja têm grande desejo de lhes comunicar a Boa Nova de Jesus Cristo e de acolhê-los na comunidade eclesial. A fé da Igreja, recebida dos apóstolos e vivida por tantas gerações e pessoas santas antes de nós, é herança preciosa e grande bênção, que "às gerações novas nós queremos anunciar: Tudo o que ouvimos e aprendemos, aquilo que nos transmitiram nossos pais, não haveremos de ocultar a nossos filhos, mas à nova geração nós contaremos" (cf Sl 77[78], 3-4).
Ao mesmo tempo que é uma prioridade para a missão da Igreja, a evangelização da juventude também é uma missão complexa, que requer pedagogias próprias e um esforço concertado de toda a comunidade eclesial: família, educadores, estruturas eclesiais, instituições da Vida Consagrada, Pastores da Igreja e os próprios jovens e suas organizações. Por isso mesmo, os bispos não quiseram concluir na 44a. Assembléia Geral, um "Documento", propriamente dito sobre o tema, mas decidiram que a reflexão deverá ser aprofundada e ampliada, com a participação da comunidade eclesial, sobretudo dos jovens.
O presente texto, portanto, é um subsídio de estudo destinado a ser ainda discutido, para receber ulteriores contribuições, antes de ser seja aprovado como Documento da CNBB numa próxima Assembléia Geral. Evidentemente, isso não significa que a própria evangelização da juventude fique suspensa, até uma futura decisão do episcopado: evangelizar os jovens é parte da missão urgente e permanente da Igreja, que não deverá sofrer interrupção.
Nesta época de grandes mudanças culturais, que atingem também as convicções e atitudes religiosas dos jovens, é importante avaliar a atuação da Igreja nesse campo e discernir bem sobre a maneira mais eficaz de evangelizar as novas gerações; por outro lado, é hora de compartilhar iniciativas e experiências novas, que surgem por toda parte, para responder melhor aos urgentes e grandes desafios no tocante à evangelização dos jovens.
É desejo dos bispos que este subsídio possa suscitar um grande interesse em todas as organizações da Igreja voltadas para a juventude, às quais são pedidas contribuições para que o Documento a ser aprovado possa tornar-se um instrumento eficaz para a missão evangelizadora da Igreja.
O Espírito de Deus inspire e conduza a Igreja no serviço evangelizador! E abençoe as jovens e os jovens, atraindo-os ao encontro com Jesus Cristo, caminho, verdade e vida!

Brasília, 26 de maio de 2006, memória de S.Filipe Neri, exemplar evangelizador da juventude.

Dom Odilo Pedro Scherer
Bispo Auxiliar de São Paulo
Secretário Geral da CNBB


INTRODUÇÃO


1. "Jesus, vendo que eles o seguiam, perguntou-lhes: Que procurais? Eles responderam: Mestre, onde moras? Ele respondeu: Vinde e vede. Foram, viram onde Jesus morava e permaneceram com ele aquele dia" (Jo 1, 38-39). A juventude mora no coração da Igreja e é fonte de renovação da sociedade. Os jovens de todos os tempos e lugares buscam a felicidade. A Igreja continua olhando com amor para os jovens, mostrando-lhes o verdadeiro Mestre – Caminho, Verdade e Vida – que os convida a viver com ele. Nós, pastores, consideramos urgente e importante o tema da Evangelização da Juventude para refleti-lo à luz da Palavra de Deus e de tantas riquezas e desafios deste momento histórico-cultural em que vivemos.
2. Jesus envia a Igreja ao mundo para dar continuidade à sua obra. "Evangelizar constitui, de fato, a graça e a vocação própria da Igreja, a sua mais profunda identidade. Ela existe para evangelizar, ou seja, para pregar e ensinar, ser o canal do dom da graça"1. Junto aos jovens, ela quer ser um meio através do qual eles se percebam como filhos amados de Deus e irmãos de todos, capazes de entender e acolher com alegria a Boa Nova que transforma a partir de dentro de cada um e ao seu redor.
3. A fé há de ser apresentada aos jovens como um encontro amoroso com Deus, que toma feições humanas na pessoa de Jesus Cristo: "No início do ser cristão, não há uma decisão dessa ética ou uma grande idéia, mas o encontro com um acontecimento, com uma pessoa que dá à vida um novo horizonte e, desta forma, o rumo decisivo"3. Desse modo, estarão em jogo duas realidades: o encontro pessoal com Jesus Cristo e a aceitação de um projeto de vida baseado no seu Evangelho. Essa adesão necessariamente incorpora a realidade em que o jovem vive como conseqüência de verdadeira encarnação cristã.
4. Queremos renovar a opção afetiva e efetiva de toda a Igreja pela juventude na busca conjunta de propostas concretas que favoreçam uma verdadeira evangelização desta parcela da nossa sociedade. A responsabilidade de anunciar Jesus Cristo e seu projeto aos jovens convoca-nos a uma constante vigilância para que a vontade de Deus e os sinais dos tempos e sejam respondidos de modo adequado, principalmente em uma época de muitas mudanças.
5. Queremos colaborar com a pluralidade de grupos, instituições e serviços que existem em nossas igrejas particulares para que trabalhem em conjunto, visando ao bem da juventude, e para que os nossos jovens, reconhecidos como sujeitos e protagonistas, contribuam com a ação de toda a igreja, especialmente na evangelização dos outros jovens.
6. Desejamos, juntos, encontrar caminhos para favorecer o desenvolvimento dos jovens, quanto ao anúncio do querigma, à educação aos valores cristãos, à formação bíblica e teológica, à iniciação à vida litúrgica, ao ensino religioso nas escolas e universidades, à
1 EN 14
2 "Evangelizar, para a Igreja, é levar a Boa Nova a todas as parcelas da humanidade, em qualquer meio e latitude, e pelo seu influxo transformá-las a partir de dentro e tornar nova a própria humanidade: ‘Eis que faço novas todas as coisas’ [...] A Igreja evangeliza quando, unicamente firmada na potência divina da mensagem que proclama, ela procura converter ao mesmo tempo a consciência pessoal e coletiva dos homens, a atividade em que eles se aplicam, e a vida e o meio concreto que lhes são próprios." EN 18
3 Bento XVI, Encíclica "Deus é Amor", no. 1
4 Documento de Santo Domingo, 114
5 Cf. CNBB, doc. 71, Diretrizes… 2003 – 2006, nº 23
6 Cf. CNBB, doc. 71, Diretrizes… 2003 – 2006, nº24 5

educação para a solidariedade e para a fraternidade7; à superação de preconceitos8; à educação psico-afetiva; à formação na ação9 e para a cidadania. Estamos convictos de que a formação da juventude contribui para promoção da dignidade de sua vida em todos os aspectos10.
7. Alegramo-nos com as muitas ações positivas que acontecem no meio da juventude e desejamos que a Igreja seja cada vez mais sinal e portadora do amor de Deus aos jovens, apresentando-lhes a pessoa e o projeto de Jesus Cristo como proposta segura e transformadora para si e para o seu meio, convocando-os a se tornarem realmente membros atuantes em suas comunidades de fé, amando-os e acreditando em suas potencialidades, entendendo-os em suas buscas para contribuir com a defesa e a promoção da vida, incentivando-os a serem cada vez mais agentes de transformação da própria realidade, estimulando os que já estão engajados a viverem um processo contínuo de crescimento, conversão pessoal e compromisso com a sociedade, "desenvolvendo um esforço amplo e constante de evangelização de jovens que lhes proporcione o conhecimento da Palavra de Deus e que os ajude a discernir, criticamente, ideologias e propostas religiosas que tentam reduzir ou instrumentalizar a fé11.
8. A evangelização implica testemunho de vida, anúncio de Jesus Cristo e adesão a ele, adesão à comunidade, participação na missão da Igreja e transformação da sociedade12. Evangelizar implica, em primeiro lugar, proporcionar o anúncio querigmático da pessoa de Jesus Cristo. Em seguida, esta experiência deverá ser aprofundada em grupos de convivência que devem conduzir catequeticamente a uma maturidade na fé e prontidão para ser discípulo e protagonista na construção do Reino de Deus por toda a vida13.
9. O presente texto quer ser um instrumento para este objetivo evangelizador. Dividimos as reflexões em três partes:
I. Elementos para o conhecimento da realidade dos jovens;
II. Um olhar de fé a partir da Palavra de Deus e do magistério;
III. Linhas de ação.
7 Cf. CNBB, doc. 71, Diretrizes… 2003 – 2006, nº123b
8 Cf. CNBB, doc. 71, Diretrizes… 2003 – 2006, nº131
9 Cf. CNBB, doc. 71, Diretrizes… 2003 – 2006, nº 201
10 Cf. CNBB, doc. 71, Diretrizes… 2003 – 2006, nº85 f
11 Cf. CNBB, doc. 71, Diretrizes… 2003 – 2006, nº 105f
12 EN 17 a 24.
13 Cf. Diretório Geral para a Catequese, 49.

I. ELEMENTOS PARA O CONHECIMENTO DA REALIDADE DOS JOVENS

10. Conhecer os jovens é condição prévia para evangelizá-los. Não se pode amar nem evangelizar a quem não se conhece. Por esse motivo, iniciamos com alguns elementos das realidades juvenis, buscando conhecer a geração de jovens cuja evangelização se apresenta como um dos grandes desafios da Igreja neste início do século XXI. É necessário ter em conta a variedade de comportamentos e situações da juventude hoje e a dificuldade de delinear um único perfil da mesma no mundo e no Brasil. Além do mais, trata-se de uma situação exposta à oscilação constante, marcada ainda com maior impacto pela velocidade social das mudanças culturais e históricas, com as vulnerabilidades e potencialidades dos jovens, tudo isso confrontado com uma experiência significativa da Igreja quanto à Evangelização da Juventude.
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14 Cf. SC 1
15 DOSSIÊ MTV: p.19. Cf. SOUZA, Ney, Evolução histórica para uma análise da pós-modernidade. In: TRASFERETTI, José Gonçalves, Paulo Sérgio Lopes. (Org.). Teologia da pós-modernidade: abordagens epistemológica, sistemática e teórico-prática. São Paulo: Paulinas, 2003. Um autor inclusive afirma que já passamos da pós-modernidade para a hipermodernidade (Cf. Gilles Lipovetsky, "Os Tempos Hipermodernos", Ed. Barcarolla)
16 "A ruptura entre o Evangelho e a cultura é sem dúvida o drama da nossa época, como o foi também de outras épocas" (EN 20).
17 Mais informações sobre esse assunto podem ser encontradas no ANEXO 1: "Impacto das tendências do mundo contemporâneo sobre os jovens"

1. AS TRANSFORMAÇÕES CULTURAIS E OS JOVENS

11. A modernidade abriu as portas do mundo para uma nova atitude do homem e da mulher frente à vida, acentuando a centralidade da razão, a liberdade, a igualdade e a fraternidade. Num primeiro momento, a Igreja fragilizou-se ao resistir à possibilidade de mudança frente ao avanço da modernidade. Uma das finalidades do Concilio Vaticano II, convocado pelo Papa João XXIII, era ajustar melhor as instituições da Igreja às necessidades de nosso tempo14.
12. Nas últimas décadas, ao lado da cultura moderna vem-se fortalecendo, a cultura pós-moderna. A pós-modernidade não é uma nova cultura que se contrapõe de modo frontal à modernidade. Constatam-se mudanças no cenário, velocidade e volume da informação, a rapidez com que a tecnologia mudou o cotidiano, novos códigos e comportamentos15. Devido à globalização e ao poder de comunicação dos meios eletrônicos, essas mudanças vêm penetrando fortemente no meio juvenil.
13. A pós-modernidade não substitui a modernidade. As duas culturas vivem juntas. Os valores da modernidade continuam sendo importantes para os jovens: a democracia, o diálogo, a busca de felicidade humana, a transparência, os direitos individuais, a liberdade, a justiça, a sexualidade e a igualdade. Uma Igreja que não acolhe esses valores encontra grandes dificuldades para evangelizar os jovens.
14. Os jovens de hoje e a Igreja em que vivem são influenciados pelos impactos da modernidade e da pós-modernidade. Alguns elementos deste momento histórico exercem grande influência na mentalidade, nos valores e no comportamento de todas as pessoas. Ignorar estas mudanças é dificultar o processo de evangelização da juventude – o grupo social que assimila esses valores e mentalidade com mais rapidez. Uma evangelização que não dialoga com os sistemas culturais é uma evangelização de verniz, que não resiste aos ventos contrários16.
15. Dentre os muitos elementos da nova cultura pós-moderna17 que influem no processo de evangelização dos jovens e no fenômeno da indiferença de uma parcela da juventude frente à Igreja, destacamos a subjetividade, as novas expressões da vivência do sagrado e a centralidade das emoções.

1.1. A subjetividade

16. A subjetividade é uma tendência que se acentua cada vez mais, não apenas entre os jovens. O ideal coletivo dos anos 80 de construir um mundo melhor foi sendo substituído por uma maior preocupação com as necessidades pessoais, com os sentimentos, com o próprio corpo, com a melhora da auto-estima, com a confiança, com a libertação dos traumas etc. O ambiente de descrédito das ideologias em que vivem faz com que
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18 Steinem, G. (1993). Revolution from within. Boston: Little, Brown.
19 Há também outros aspectos do neo-pentecostalismo como o atendimento personalizado, ausência de burocracia e de exigências, simplicidade de doutrina, flexibilidade moral, espírito de tolerância, organização simplificada que eliminam intermediários, espaços bonitos, encontros alegres e não formais.
segmentos de jovens tenham forte tendência de viver somente no presente. Este fenômeno tem o efeito de se concentrar, no momento atual, na busca de sensações e emoções passageiras. Ao mesmo tempo, há outros segmentos que manifestam preocupação com um futuro mais próximo.

17. Nesse contexto faz-se necessário buscar um equilíbrio entre o projeto individual e o projeto coletivo. Os dois grandes movimentos de nosso tempo, o movimento pela justiça social e o movimento pela auto-realização, são metades de um todo esperando para se unirem numa grande força de renovação18.

1.2. As novas expressões da vivência do sagrado

18. Em tal conjuntura, acontece uma redescoberta da dimensão religiosa. Há a busca de uma espiritualidade que dá unidade e gosto à vida. Trata-se, entretanto, de uma religião mais individual. Frente a tanto medo, pressa e caos, muitas pessoas voltam-se para vários tipos de manifestações religiosas e místicas (ocultismo, nova era, esoterismo, horóscopos, astrologia...). Outras pessoas refugiam-se em grupos fundamentalistas onde as verdades são ensinadas de maneira dogmática evitando, assim, a angústia da dúvida.
19. Embora esta mudança cultural possa oferecer uma terra fértil à religião, é importante analisar com cautela o retorno dessas novas expressões do sagrado. A abertura para o transcendente não significa, necessariamente, uma aceitação das religiões organizadas. Muito fermento espiritual está acontecendo fora das instituições. Há estudos que demonstraram que muitos jovens estão procurando razões para viver sem envolver-se com uma "igreja". Trata-se de uma espiritualidade centrada na pessoa e não na instituição e, por isso, busca-se algo que satisfaça suas necessidades.
20. No entanto, a mudança cultural abre uma porta para o processo de evangelização dos jovens. Hoje é mais fácil trabalhar a espiritualidade, em todas as suas dimensões, que nos anos 80, quando o tempo dedicado às celebrações e à oração era freqüentemente visto como algo secundário frente à urgência da transformação social. É necessário, contudo, resistir à tentação de reduzir ou manipular a mensagem do Evangelho para ganhar mais adeptos.
1.3 A centralidade das emoções
21. Se antes exaltava-se a razão, hoje acentua-se a emoção. Se a importância dada às emoções é positiva, sua absolutização leva a um esvaziamento intelectual, do compromisso transformador e da consciência crítica, leva à superficialidade e à falta de perseverança, podendo facilmente conduzir ao fundamentalismo, que tem suas expressões dentro de todas as grandes religiões.
22. O fenômeno religioso que mais chama a atenção, dentro desse novo contexto cultural centrado nas emoções, é o crescimento do neopentecostalismo, que acentua a subjetividade e o elemento afetivo em sua metodologia de evangelização19. Este fenômeno é mais visível pelo número de igrejas pentecostais que nascem a cada dia, principalmente nas periferias das grandes cidades. Com a diversificada oferta de escolha do sagrado, por parte do "consumidor", a fé é regulada pelo mercado, de modo especial,
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20 Dr. William César Castilho Pereira, professor da PUC Minas. Cf. PEREIRA, William César Castilho (Org.). Análise Institucional na vida religiosa consagrada. Belo Horizonte/Rio de Janeiro: O Lutador/CRB,2005.
21 Em outros países da Europa, para efeito de execução de políticas públicas, há uma tendência de considerar como jovens os indivíduos com até 30 anos de idade.
22 IBGE. Censo Demográfico de 2000.
pela TV. "A religião deixou de representar o espaço da relação do crente com Deus para se transformar em veículo de ascensão social ou em promessa de felicidade plena. Troca-se a elaboração analítica que exige a dor da busca e da reflexão por sessões de entretenimento religioso"20.

23. A tendência de acentuar os sentimentos, no mundo contemporâneo, tem forte penetração no meio dos jovens e levanta questões importantes referentes à metodologia de trabalho pastoral. Por outro lado, na medida em que aumenta o nível de escolaridade dos jovens, aumenta, também, a necessidade de uma base intelectual da fé; caso contrário, muitos acabam abandonando sua fé. É importante lembrar que as duas culturas continuam convivendo juntas: a modernidade que acentua a razão e a pós-modernidade que acentua a centralidade das emoções.
24. Há necessidade de levar em conta os dois enfoques da cultura contemporânea e manter um equilíbrio entre os dois pólos: o racional e o emocional. Emoções, sentimentos e imaginação precisam ser integrados em uma metodologia que tenha objetivos claros. Ao mesmo tempo, a razão deve deixar espaço para as emoções e a imaginação. Que a mensagem do Evangelho seja apresentada como resposta a todas as dimensões da vida do jovem. A formação deve ser integral, isto é, considerar as diversas dimensões e os processos.

2. PERFIL DA JUVENTUDE BRASILEIRA

25. Nossa intenção é considerar a juventude com suas potencialidades para renovar a sociedade e a Igreja. A juventude é a fase do ciclo de vida em que se concentram os maiores problemas e desafios, mas é, também, a fase de maior energia, criatividade, generosidade e potencial para o engajamento.
2.1. Perfil sócio-econômico
26. Para caracterizar a juventude, as estatísticas brasileiras geralmente seguem os parâmetros de organismos internacionais, considerando o grupo etário de 15 a 24 anos21. Em 2000, no último recenseamento geral da população, estavam nessa faixa etária cerca de 34 milhões de pessoas, o que representa 20% da população brasileira22. Se acrescentarmos a esse contingente os indivíduos de 25 a 29 anos, em geral designados pelos demógrafos de "adultos jovens", teríamos um total de 47 milhões. A juventude brasileira é marcada por uma extrema diversidade e manifesta as diferenças e as desigualdades sociais que caracterizam nossa sociedade. Trata-se de um contingente populacional bastante significativo, em idade produtiva, que se constitui em uma importante força a ser mobilizada no processo de desenvolvimento de nosso país.
27. Dentre as várias diferenciações que recortam a juventude, estão as de classe social, cor e etnia, sexo, local de moradia, as diferentes situações de responsabilidade frente à família, além das variações relativas ao gosto musical ou estilo cultural e as pertenças associativas, religiosas, políticas.
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23 ANEXO 2, "Situação socioeconômica da juventude brasileira".
24 Novaes, Regina e Vital, Christina. A juventude de hoje: (re)invenções da participação social. In: Andrés Thompson (org.) Associando-se à juventude para construir o futuro. São Paulo: Ed. Peirano, 2006, p. 112-3.
25 Há 32,1 milhões de brasileiros com mais de 16 anos e algum tipo de acesso à Internet, segundo o Ibope. Eram menos de 10 milhões em 2002. (Folha de São Paulo, 13/02/06, página A2). A pesquisa realizada pelas Ongs Ibase e Pólis revelou que 51,2% do 8000 jovens entrevistados nas regiões metropolitanas, não tinham acesso a computadores, mas a exclusão digital é muito influenciada pelo pertencimento de classe: se 80% dos jovens das classes A/B têm esse acesso, entre os jovens das classes D/E este incide cai para 24,2% (Ibase & Polis, 2005, p. 27).

26 João Paulo II, falando na sua visita a Cuba, em 1998, em que colocou claramente que nem o marxismo nem tampouco a versão neoliberal do capitalismo apresentaram soluções para um desenvolvimento equilibrado.
28. Há jovens que têm um padrão de vida elevado, mas são uma minoria. A maioria dos 34 milhões de jovens brasileiros representa um dos segmentos populacionais mais fortemente atingidos pelos mecanismos de exclusão social. As estatísticas demonstram que a juventude é um dos grupos mais vulneráveis da sociedade brasileira. Ela é especialmente atingida pelas fragilidades do sistema educacional, pelas mudanças no mundo do trabalho e, ainda, é o segmento etário mais destituído de apoio de redes de proteção social.
29. Eis alguns dos principais problemas com os quais se deparam, hoje, os jovens brasileiros23: a disparidade de renda; o acesso restrito à educação de qualidade e frágeis condições para a permanência nos sistemas escolares; o desemprego e a inserção no mercado de trabalho; a falta de qualificação para o mundo do trabalho; o envolvimento com drogas lícitas (álcool, tabaco) e ilícitas; a gravidez na adolescência; a violência no campo e na cidade; a intensa migração; as mortes por causas externas (homicídio, acidentes de trânsito e suicídio); o limitado acesso às atividades esportivas, lúdicas e culturais.
30. O impacto da pobreza, em uma sociedade que sacraliza o consumo, atinge a família, o primeiro lugar de socialização do jovem. Cresce o número de homens e mulheres que não fundam lares estáveis, levando o núcleo familiar a se desintegrar. Essa situação deixa fortes cicatrizes emocionais na personalidade de muitos jovens em um momento crítico de suas vidas. Impressiona o número de jovens nas comunidades juvenis que enfrentam problemas emocionais sérios.
31. São três as marcas da juventude na atualidade24: o "medo de sobrar, por causa do desemprego, o medo de morrer" precocemente, por causa da violência e a vida em um mundo conectado, por causa da Internet25. O sentido e a dureza dessas marcas anseiam por uma Boa Notícia que, a partir de um olhar de fé, pode ser encontrada no interior da própria juventude.
32. Esse quadro aponta a necessidade de promover mudanças mais profundas e estruturais no modelo de desenvolvimento econômico-social adotado no país, com reorientação de investimentos que garantam os direitos básicos da população – aos jovens em particular – nas áreas de educação, criação de empregos, infra-estrutura urbana, saúde, acesso à cultura e ao lazer, que têm repercussões na situação de segurança pública. João Paulo II acusou o liberalismo de "subordinar a pessoa humana e condicionar o desenvolvimento dos povos às forças cegas do mercado, sobrecarregando desde seus centros de poder aos países menos favorecidos com cargas insuportáveis". No mesmo discurso o Santo Padre considerava que o neoliberalismo causou o "enriquecimento exagerado de uns poucos à custa do empobrecimento crescente de muitos, de forma que os ricos são cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres"26.
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27 Secretaria Geral da Presidência da República, Coordenação Nacional do PROJOVEM, março 2005, Regina Novaes.
28 Para maiores informações ver Helena Abramo, Helena e Branco, Pedro Paulo (orgs.). Retratos da Juventude. São Paulo, Ed. Perseu Abramo/Instituto da Cidadania, 2005.
29 Ibase & Pólis. Juventude Brasileira e Democracia (este título em itálicos): participação, esferas e políticas públicas. Rio de Janeiro: 2005, p. 72

2.2. Protagonismo e participação social

33. Duas imagens da juventude predominam nos meios de comunicação e na opinião pública. De um lado, as propagandas e as novelas apresentam os jovens como modelos de beleza, de saúde e de alegria, despreocupados, e impõem padrões de vida e de consumo aos quais poucos jovens realmente têm acesso. Os jovens também são caracterizados pela força, ousadia, coragem, generosidade, espírito de aventura, gosto pelo risco. De outro, nos noticiários, estão os jovens envolvidos com problemas de violência ou comportamentos de risco, que são, na maior parte das vezes, negros e oriundos dos setores populares.
34. Essas duas imagens polares convergem para o mesmo senso comum que considera a juventude individualista, consumista e politicamente desinteressada. Mas esses são estereótipos que não dão conta da diversidade de experiências da juventude brasileira. Por um lado, é verdade que:
a) segundo pesquisas da UNICEF, 65% dos adolescentes (12 a 17 anos) nunca participaram de atividades associativas e/ou comunitárias27;
b) de acordo com um levantamento nacional recente, realizado pelo Instituto Cidadania, entre jovens de 15 a 24 anos de todo Brasil28, apenas uma minoria participa formalmente de movimentos estudantis, sindicatos, grupos religiosos, associações profissionais e partidos; 15% dos jovens participam de algum agrupamento juvenil.
35. No entanto, atualmente no Brasil há uma série de novas formas de participação juvenil, entre as quais podemos destacar:
a) a pertença a grupos (pastorais, movimentos eclesiais, redes, ONGs e outras organizações juvenis) que atuam para transformar o espaço local, nos bairros, nas favelas e periferias;
b) a participação em grupos que trabalham nos espaços de cultura e lazer: grafiteiros, conjuntos musicais, de dança e de teatro de diferentes estilos, associações esportivas;
c) mobilizações em torno de uma causa e/ou campanha: grupos ecológicos, comitês da Campanha contra a Fome, ações contra a violência e pela paz, grupos por uma outra globalização etc;
d) grupos reunidos em torno de identidades específicas: mulheres, negros, indígenas, pessoas com necessidades especiais etc.
36. Para além do discurso corrente de que os jovens de hoje não participam, são desinteressados e alienados, alguns estudos recentes têm demonstrado que os jovens desejam participar ativamente da vida social, têm muitas sugestões do que deve ser feito para melhorar a situação do país e, querem dar sua contribuição. Entretanto não encontram espaços adequados: as formas de participação presentes na sociedade e no Estado são percebidas pelos jovens como muito distantes de sua realidade cotidiana29.

2.3. Perfil religioso

37. Constata-se que o perfil religioso do jovem brasileiro é semelhante ao da população. Segundo o Censo de 2000, os católicos no país eram 73,8% da população. Entre os jovens de 15 a 24 anos, eram 73,6%. Enquanto no conjunto da população a presença evangélica representava 15,5%; entre os jovens a adesão às igrejas evangélicas era um
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30 Em todas as faixas etárias as outras religiões (espiritismo kardecista, umbanda, candomblé, judaísmo, religiões orientais, islã etc.) somaram 3% e ,entre os jovens de 15 a 24 anos, 3,3% .
31 Em uma pesquisa nacional representativa da juventude brasileira, realizada em metrópoles, cidades médias e pequenas e grandes, e também no interior, 11% os jovens se apresentaram como sem religião, sendo que 10% declararam acreditar em Deus, mas não ter religião, e 1% identificou-se como ateu e agnóstico (cf. Juventude, percepções e comportamentos: a religião faz a diferença, artigo de Regina Novaes em "Retratos da Juventude Brasileira – análise de uma pesquisa nacional". São Paulo: Fundação Perseu Abramos, 2005, p. 263-290). Outro estudo desenvolvido numa metrólope reforça essa constatação: 98,5% dos 800 jovens entrevistados, com idades entre 15 e 24 anos, disseram acreditar em Deus. (Novaes e Mello, Jovens do Rio 2002)
pouco menor: 14,2%. A maior diferença encontrava-se no grupo que se identificava como "sem religião": na população, 7,4% e entre os jovens: 9,3%30.
38. Embora expressivo, este dado não deve ser interpretado como um avanço do ateísmo entre a juventude brasileira. A maior parte desses jovens vive uma experiência religiosa. Alguns estudos têm demonstrado que a grande maioria dos jovens sem religião acredita em Deus ou tem outras crenças e, portanto, são inspirados por uma mística, muito embora não estejam vinculados a uma instituição religiosa em particular31.
39. Além disso, fenômenos que marcam a dinâmica do campo religioso na atualidade são intensificados quando se trata da população jovem, como a busca contínua por uma expressão de fé que dê sentido às suas vidas (o que acelera o trânsito religioso); a atração por manifestações religiosas exóticas; e a elaboração de sínteses pessoais a partir do repertório de crenças e práticas disponíveis em vários sistemas religiosos. Nesse contexto, florescem espiritualidades relacionadas à idéia do estabelecimento de uma "Nova Era", que integraria o ser humano ao cosmos, em uma dimensão holística, e responderia a preocupações desde aquelas relativas à saúde física e psíquica, com as correspondentes práticas terapêuticas, até o respeito e defesa da biosfera.
40. Isso se dá em uma fase do ciclo de vida em que as pessoas costumam se questionar acerca de vários aspectos de suas vidas: caminhos profissionais, continuidade dos estudos, relacionamento afetivo. É recorrente a experimentação em muitos desses âmbitos originando vínculos provisórios. Também a adesão religiosa torna-se campo de reflexões e experiências. Muitos jovens colocam em xeque a herança religiosa recebida na família, o que tem levado a diferentes percursos: a opção consciente pela tradição religiosa na qual foram educados; o rompimento com essa herança – que pode se traduzir na conversão a outro sistema religioso ou a desvinculação religiosa. Inclusive, tem-se verificado que jovens educados que não passaram por uma socialização religiosa têm aderido a diferentes grupos religiosos.
41. Muitos jovens ligados às instituições religiosas dispõem generosamente de seu tempo livre para desenvolver as atividades de seu grupo. Também porque nessas ocasiões costumam estar em contato com outros jovens e se alegram nesta convivência. Tal disponibilidade fica reduzida quando os jovens iniciam os estudos universitários ou a vida profissional ou, ainda, quando associam trabalho e estudo.
42. Sensíveis às manifestações artísticas e culturais da sociedade contemporânea, os jovens de diferentes identidades religiosas aderem com entusiasmo a eventos semelhantes no âmbito religioso (shows, concentrações em estádios etc). Assim tem crescido o número de bandas e artistas religiosos.
43. Em nossa Igreja há uma presença significativa de jovens em vários setores da vida eclesial: nas comunidades de base e nas paróquias, participando das equipes de liturgia e de canto, atuando como catequistas, em diversas pastorais. Estão presentes também nas Pastorais de Juventude, nos Movimentos Eclesiais, nas Novas Comunidades e nas diferentes iniciativas promovidas pelas Congregações Religiosas.
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32 Esta rica herança da Igreja do Brasil e da América Latina está descrita no anexo 3.
44. Muitas vocações sacerdotais e religiosas e para outros ministérios eclesiais têm sido suscitadas por essa participação. Chama a atenção o fato de que um número crescente de jovens esteja buscando propostas vocacionais exigentes nos campos da contemplação e da ação. Outro traço a destacar é a responsabilidade e a seriedade com que muitos jovens católicos, animados pela sua fé, têm abraçado a dimensão do serviço, seja no cuidado aos mais pobres, ou na atuação em movimentos e organizações sociais com vistas à construção de uma sociedade justa e solidária. No entanto, nem sempre os jovens atingidos pela ação pastoral da Igreja na catequese crismal e em outras iniciativas pastorais têm sido conquistados para um sólido engajamento na comunidade de fé.

3. VALOR DA EXPERIÊNCIA ACUMULADA DA IGREJA

45. Frente ao desafio de evangelizar a juventude contemporânea, a Igreja não está começando do zero. Há um caminho histórico percorrido por ela que revela uma herança muito rica. Há uma corrente através da qual uma geração de jovens e agentes evangelizadores adultos passa a experiência acumulada para outra. A Igreja Católica é uma das organizações que tem mais experiência acumulada e sistematizada no trabalho com a juventude. É importante resgatar essa experiência. Em cada época, na medida em que mudavam os desafios, os enfoques, os valores e o ambiente cultural da sociedade, a mentalidade dos jovens também mudava. Os jovens são mais sensíveis às mudanças e propensos a aceitar o novo. Tudo o que acontece na sociedade tem seus reflexos na ação evangelizadora da juventude. Os jovens que são atingidos pela ação evangelizadora estão inseridos simultaneamente na sociedade e na Igreja.
46. Em cada época há necessidade de adequar as concepções e as práticas de evangelização para se relacionar com os jovens. Se a Igreja apresentou uma proposta que se tornou predominante, não significa que todos os jovens tenham aderido a ela. Aprendemos com as conquistas e os erros do passado. Nem tudo muda de uma época para a outra. Mudam, às vezes, os enfoques, o ponto de partida, alguns elementos da metodologia, sendo que outros permanecem. Na Igreja do Brasil, muitas forças pastorais atuam junto aos jovens e com eles. Cada uma delas tem a sua própria riqueza e contribui, no interior da Igreja, para a Evangelização da Juventude. Destacamos entre elas as Pastorais da Juventude, os Movimentos Eclesiais, o Serviço Pastoral das Congregações e as Novas Comunidades. Reconhecemos que a evangelização dos jovens é obra de muitas mãos, inclusive com a contribuição da Pastoral Familiar, Pastoral Vocacional, Pastoral Catequética, Ação Missionária32.
II. UM OLHAR DE FÉ A PARTIR DA PALAVRA DE DEUS E DO MAGISTÉRIO
47. Tendo procurado escutar e compreender os gritos e clamores dos jovens que a Igreja é chamada a evangelizar na atualidade, é necessário olhar com a fé e à luz da palavra da Igreja o caminho evangelizador a ser percorrido, a partir do objetivo geral da ação evangelizadora da Igreja no Brasil, ponto de referência de toda a ação pastoral:
EVANGELIZAR
proclamando a Boa Nova de Jesus Cristo,
caminho para a santidade,
por meio do serviço, diálogo, anúncio e testemunho de comunhão,
13
33 Um resumo interessante da vida de Jesus é apresentado em CELAM. (1997). Civilização do amor: Tarefa e esperança, Orientações para a Pastoral da Juventude latino-americana. São Paulo: Paulinas, Páginas 101-121.
34 Ecclesia in America, n. 67

à luz da evangélica opção pelos pobres,
promovendo a dignidade da pessoa,
renovando a comunidade eclesial,
formando o povo de Deus e
participando da construção de uma sociedade justa e solidária,
a caminho do Reino definitivo.
48. Ser cristão significa conhecer a pessoa de Jesus Cristo, fazer opção por Ele, unir-se a tantos outros que também o encontraram e, juntos, trabalhar pelo Reino e por uma nova sociedade. A evangelização da juventude passa por alguns eixos temáticos, a saber, o seguimento de Jesus Cristo, a Igreja, comunidade dos seguidores de Jesus, e a construção de uma sociedade solidária. A Igreja, consciente de sua missão, oferece seu ensinamento e a sua visão a respeito da juventude e de sua evangelização.
1. O SEGUIMENTO DE JESUS CRISTO
49. A busca juvenil de "modelos" e "referências" é uma porta que se abre para o processo de evangelização. Aqui está a grande oportunidade da ação evangelizadora de colocar os jovens em contato com modelos autênticos. Trata-se de uma oportunidade de apresentar, de modo especial, Jesus Cristo como o grande modelo de sua vida, para que se possa dizer com São Paulo: "Já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim" (Gl 2,20).
50. Com criatividade pastoral é importante apresentar Jesus Cristo dentro do contexto em que o jovem vive hoje e como resposta às suas angústias e aspirações mais profundas. "Devemos apresentar Jesus de Nazaré compartilhando a vida, as esperanças e as angústias do seu povo" (DP 176). Um Jesus que caminha com o jovem, como caminhava com os discípulos de Emaús , escutando, dialogando e orientando33.
51. Jesus Cristo é o ponto culminante da ação de Deus na história humana. O Verbo se fez carne e morou em nosso meio (Jo 1,14). É o fato mais decisivo da história da humanidade. "Jesus é o rosto humano de Deus e o rosto divino do homem" 34. É testemunha do amor infinito de Deus que se revela em seus ensinamentos, em seus milagres e exemplo de vida. A partir da morte e ressurreição de Jesus Cristo e do envio do Espírito Santo, a Boa Nova se espalhou para a humanidade.
52. Jesus congrega ao seu redor um círculo de discípulos e discípulas que o seguem. É nesta vida comunitária que vão aprender o sentido de vida. O relacionamento é diferente. Devem chamar-se de irmãos! (Mt 10, 24-25). Os Evangelhos mencionam, em primeiro lugar, os Doze (Mt 10,1) e, depois, para além desse pequeno grupo mais seleto, os setenta e dois que ele envia em missão (Lc 10,1) e todos os demais que o seguem (Mt 8,21). Jesus sabia que não estaria muito tempo com eles. Precisava formá-los e transformá-los para a missão que deveriam assumir com seu retorno ao Pai.
53. O jovem – assim como todo o cristão – é convidado por Jesus a ser discípulo. O convite é pessoal: "Vem e segue-me" (Lc 18,22). Ele sempre chama os seus pelo nome (cf. Jo 10,4). O entusiasmo provocado pelo convite é revelado por André que corre em busca do seu irmão Simão e lhe anuncia jubiloso: "Encontramos o Messias" (Jo 1,41). O seguimento e o testemunho até dar a vida, são dois aspectos essenciais da resposta do discípulo. O relacionamento entre o Mestre e o discípulo significa uma vinculação pessoal com ele: "Vós sois meus amigos" (Jo 15,14).
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35 Cf. Ecclesia in America n.12
54. O grande modelo do seguimento é Maria. Nela descobrimos todas as características do discipulado: a escuta amorosa e atenta (cf. Lc 1, 26-38), a obediência à vontade do Pai (cf. Lc 1,38), a fidelidade a ponto de acompanhar seu filho até a cruz (cf. Jo 19,25-27) e continuar sua missão evangelizadora (cf. At 2).
55. O desafio para o jovem – assim como para todos os que aceitam Jesus como caminho – é escutar a voz de Cristo em meio a tantas outras vozes. O jovem escuta a voz do Mestre de diferentes maneiras. A ação evangelizadora deve ajudá-lo a ter contato pessoal com Jesus Cristo nos Evangelhos, sua mensagem, suas atitudes, sua maneira de tratar as pessoas, de acolher os pecadores, sua coragem profética e a coerência entre seu discurso e sua vida. Os Evangelhos assinalam com freqüência que Jesus rezava e passava horas e noites em oração diante do Pai. As celebrações e a oração são espaços importantes onde este encontro pessoal acontece e é aprofundado, no silêncio e na contemplação. O jovem encontra o Senhor na leitura dos Evangelhos e na vida comunitária, na qual aprende a escutar a voz de Deus no meio das circunstâncias próprias de nosso tempo, vivenciando assim o mistério da Encarnação.
56. A formação do discípulo acontece na vida de comunidade, onde se experimenta o mandamento novo do amor recíproco, que suscita um ambiente de alegria, de amizade, de carinho, de acolhida e de respeito. O encontro com Cristo, presente entre aqueles que se reúnem em seu nome (cf. Mt 18,20), no amor, trará conseqüências e deixará marcas indeléveis na capacidade de relacionamento entre as pessoas, envolvendo os sentimentos, a inteligência, a liberdade e o compromisso com um novo modo de agir na Igreja e na Sociedade. Comunidades e grupos assim formados atrairão os que vierem de fora.
57. Quem se torna discípulo de Jesus, transforma-se em portador de sua mensagem. Jesus chama o discípulo para enviá-lo em missão. No encontro com Cristo, o novo discípulo sente-se impelido pelo Espírito Santo a anunciar aos outros a experiência que teve com Cristo e como nele reconheceu o Messias, o Salvador. "Como o Pai me enviou, também eu vos envio. Recebei o Espírito Santo" (Jo 20,21-22). Depois da ressurreição: "Ide, fazei com que todos os povos se tornem meus discípulos" (Mt 28,19).
58. "O jovem é o evangelizador privilegiado de outros jovens". É uma afirmação repetida em muitos documentos da Igreja. Esta missão só pode nascer do encontro pessoal com o Mestre, aprendendo a ser sempre mais semelhante a Ele. Para evangelizar, exige-se a experiência de ser evangelizado, isto é, de ter descoberto que Jesus é o Caminho, a Verdade e a Vida.
59. O encontro com Jesus Cristo não é algo abstrato. É necessário mostrar aos jovens os lugares e os momentos concretos nos quais é possível encontrá-lo. Os lugares privilegiados do encontro com Jesus Cristo são: a Sagrada Escritura, a Liturgia, sobretudo a Eucaristia; a comunidade reunida em seu nome, os irmãos e irmãs, especialmente os mais necessitados, nos quais Jesus Cristo está misteriosamente presente35.
60. A sensibilidade especial dos jovens para as situações de pobreza e desigualdade social nos abre um caminho espiritual e de formação de consciência. Jesus revela que o pobre é um sinal de sua presença em nosso meio. "Tive fome e me destes de comer. Tive sede e me destes de beber. Era forasteiro e me acolhestes. Estive nu e me vestistes, doente e me visitastes, preso e viestes ver-me" (Mt 25, 35-36). O pobre, para quem descobriu em Jesus o "modelo", é alguém que não nos deixa dormir em paz. Jesus alerta contra o perigo da prioridade dada às riquezas materiais, raiz da má distribuição de renda. Há uma pergunta que não pode deixar de nos incomodar: Por que a verdade de nossa fé não teve
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36 CELAM. (2005). V Conferência do Episcopado da América Latina e do Caribe, Documento de participação. São Paulo: Paulinas.
37 Homilia de Bento XVI para mais de um milhão de jovens na Jornada Mundial da Juventude em Colônia, em 2005.
maior incidência social na América Latina, num continente de cristãos? "O discípulo se compromete com coerência de vida e de ação na transformação dos sistemas políticos, econômicos, trabalhistas, culturais e sociais que mantêm na miséria espiritual e material milhões de pessoas em nosso continente"36.
2. IGREJA, COMUNIDADE DOS DISCÍPULOS DE JESUS
61. Quando evangelizados – com testemunho e metodologia - os jovens se empolgam com a pessoa e o projeto de Jesus Cristo. Por que, contudo, frente à Igreja muitos mostram resistência? Muitos jovens têm dificuldade para entender que eles são Igreja. Constatamos que a imagem que muitos deles têm da Igreja é de algo ultrapassado, burocrático, e que fala uma linguagem que não se conecta com sua vida. Freqüentemente compreendem-na apenas como instituição e não como a comunidade dos seguidores de Jesus. Em muitos ambientes universitários, a Igreja é apresentada como cúmplice da injustiça e, em diferentes situações históricas, contra o progresso humano. Falta aos jovens o conhecimento de tantas experiências de solidariedade na história da Igreja, tendo como protagonistas missionários como Pe. Anchieta, Pe. Antônio Vieira, Pe. Manoel de Nóbrega, Bartolomeu de Las Casas e tantos outros. Nas cidades grandes, chama a atenção a ausência dos jovens na vida eclesial, de modo especial, os de nível social e escolaridade mais elevado, onde não há um trabalho pastoral específico com eles. Em alguns lugares, a Igreja se afastou e os perdeu. Advertimos a respeito da necessidade urgente de apresentar missionariamente a verdadeira face da Igreja à juventude e trabalhar a relação entre fé e razão.
62. As resistências contra a Igreja se vencem progressivamente com o amadurecimento da compreensão dos contextos históricos e quando se destacam os aspectos positivos, como a credibilidade da Igreja nas pesquisas sobre as instituições sociais, como também o contato com experiências autênticas de Igreja que contradizem as afirmações negativas.
63. A ausência dos jovens da Igreja, também, aparece na dificuldade de atrair vocações para o ministério presbiteral, para a vida consagrada e para o laicato. Na evangelização da juventude está em jogo o futuro da Igreja. No entanto, a Igreja não trabalha com a juventude somente para buscar vocações que garantem sua continuidade mas, também, devido à riqueza que a presença dos jovens traz para a Igreja.
64. A Igreja tem seu lado divino, mas, também, seu lado humano. É santa, mas formada por homens e mulheres marcados pela realidade do pecado. Devido à fraqueza humana, ela sofre continuamente a tentação de se afastar da mística do seu fundador. A Igreja que evangeliza precisa ser continuamente evangelizada. "Pode-se criticar muito a Igreja. Nós o sabemos e o Senhor mesmo nos disse que ela é como uma rede com peixes bons e ruins, um campo com trigo e joio. O Papa João Paulo II, que nos mostrou o verdadeiro rosto da Igreja nos numerosos beatos e santos que proclamou, também pediu perdão pelo mal causado, no correr da história, pelas palavras ou atos de homens da Igreja"37.
65. É importante que os jovens sejam ajudados a entender que as ciências humanas apontam para a ambivalência de todas as estruturas. Por um lado, elas são necessárias. Sem as estruturas não há continuidade no tempo e a mensagem original morre. Sem a Igreja, não estaria viva a mensagem de Jesus hoje e não teríamos os Evangelhos. Através da Igreja,
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38 Cf. Ef 4,5.
39 CONCÍLIO VATICANO II, Lumen Gentium 32.
40 Cf. CNBB, doc. 71, Diretrizes… 2003 – 2006
uma geração de crentes passa sua fé à seguinte. Por outro lado, as estruturas se desgastam com o tempo, dificultando a compreensão da Boa Nova, que está em sua origem. Por isso, há necessidade de renovação contínua.
66. Um caminho importante para despertar nos jovens o amor pela Igreja e o sentido de pertença a ela é a referência às experiências das primeiras Comunidades dos Atos dos Apóstolos, para concretizar hoje a vida eclesial que nasceu do derramamento do Espírito no Pentecostes, na qual resplandecia (At 2, 42-47) a oração, a fidelidade à Palavra, a partilha dos bens e a Eucaristia ("Fração do Pão").
67. Em nosso tempo, à luz do Concílio Vaticano II e de tantas manifestações dos Papas e dos Bispos, insiste-se na Comunhão e Participação, palavras e realidades que indicam uma estrada a ser também proposta aos jovens. Sua raiz é o Batismo, pelo qual se manifesta uma igualdade fundamental entre todos os cristãos, fazendo-os todos responsáveis pela Igreja, cada qual segundo a própria vocação. A Igreja, novo povo de Deus, é descrita como Corpo de Cristo, uno na variedade dos membros, onde todos têm igual dignidade. "É uno o povo eleito de Deus: ‘Um só Senhor, uma só fé, um só batismo’38; comum é a dignidade dos membros pela sua regeneração em Cristo, comum, a graça de filhos, comum a vocação à perfeição; uma só a salvação, uma só a esperança e a unidade, sem divisão"39.
68. Por isso, muitos documentos do Magistério pontifício e episcopal apontam para a renovação da vida da Igreja através do caminho do serviço, no qual todos os fiéis, começando dos ministros ordenados, buscam superar a tentação do autoritarismo e assumir o modelo do lava-pés e atentos à palavra do Senhor: "Sabeis que os governantes das nações as dominam e os grandes as tiranizam. Entre vós não deverá ser assim. Ao contrário, aquele que quiser tornar-se grande, entre vós, seja aquele que serve e o que quiser ser o primeiro, dentre vós, seja o vosso servo. Desse modo, o Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por muitos". (Mt 20, 25-28). O modelo de todos é Jesus, o Bom Pastor, que conhece os seus pelo nome e está disposto a dar sua vida por eles.
69. Cada cristão, por seu batismo, é responsável pela construção da Igreja, para que ela seja um espelho do amor de Deus no mundo e sinal do Reino. "Na história da Igreja, todas as vezes que se buscaram formas mais elevadas de vida no Evangelho, colocou-se na vida fraterna seu apoio fundamental." 40 É importante que os jovens tenham a experiência de relacionamento fraterno autêntico e do exercício da autoridade como serviço em sua comunidade paroquial, nas Comunidades Eclesiais de Base, nas Pastorais nas quais se envolvem, nos Movimentos Eclesiais ou Novas Comunidades com os quais se comprometem, como sinal de que é possível viver com autenticidade o seguimento de Jesus.
70. Nas atividades pastorais com a juventude, faz-se necessário oferecer canais de participação e envolvimento nas decisões, que possibilitem uma experiência autêntica de co-responsabilidade e o envolvimento no processo de renovação contínua da Igreja. Trata-se de valorizar a participação dos jovens nos conselhos, reuniões de grupo, assembléias, equipes, processo de avaliação e planejamento.
71. Mas a Igreja não existe somente para fortalecer a vivência da fé em comunidade. Existe para construir o Reino e o Reino é mais amplo do que a Igreja. A Igreja, comunidade dos
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41 Cf. Gaudium et Spes, 38. Outros textos relevantes são Gaudium et Spes 78b (a fraternidade universal é condição da paz) e Gaudium et Spes 92 (o diálogo em vista da fraternidade, respeitando a diversidade de etnias, culturas e religiões). A fraternidade universal é ressaltada também como fim do anúncio de Cristo (Ad Gentes 8) e do apostolado dos cristãos leigos (Apostolicam Actuositatem 14) e fundamento da oposição da Igreja a toda forma de discriminação das pessoas humanas (Nostra Aetate 5).
42 Cf; EN 14
43 AG 11
que crêem em Jesus, constitui o germe e o início deste Reino, que, como fermento na massa ou pequena semente, torna-se imensa árvore.
72. O Concílio Vaticano II propõe, como vocação da humanidade inteira e como meta a ser efetiva e intensamente procurada, a fraternidade universal. Afirma, também, que a revelação cristã "favorece poderosamente esta comunhão entre as pessoas", e ao mesmo tempo leva a uma compreensão mais profunda das leis da vida social.41 Se a juventude for levada a enxergar uma Igreja que procura ser isso, graças ao caminho que segue, terá menos dificuldade de assumi-la com sua alegria vibrante.
73. É importante falar da Igreja aos jovens como o Mistério que persevera através da história humana devido à presença do Espírito Santo. A Igreja existe não somente para ser um lugar de encontro agradável e de segurança dos que partilham a mesma fé; ela existe para evangelizar, isto é, para anunciar a Boa Notícia do Reino, proclamado e realizado em Jesus Cristo 42, através de nossas fragilidades e riquezas.
74. Um grande desafio é reconhecermos que também no segmento da sociedade chamado juventude se encontram as sementes ocultas do Verbo, como fala o Decreto Ad Gentes, do Vaticano II 43. Entrar em contato com o ‘divino’ da juventude é entender sua psicologia, sua biologia, sua sociologia e sua antropologia com o olhar da ciência de Deus. O jovem necessita não somente que falemos para ele de um Deus que vem de fora, mas de um Deus que é real dentro dele em seu modo juvenil de ser. A evangelização da Igreja precisa mostrar aos jovens a beleza e a sacralidade da sua juventude, o dinamismo que ela comporta, o compromisso que daqui emana, assim como a ameaça do pecado, da tentação do egoísmo, do ter e do poder e com isto, auxiliar também na conscientização de tudo aquilo que procura danificar esta obra de Deus. Uma verdadeira espiritualidade possibilita ao jovem encontrar-se com a realidade sublime que há dentro dele, manter um diálogo constante com aquele que o criou.
75. Considerar o jovem como lugar teológico é acolher a voz de Deus que fala por ele. A novidade que a cultura juvenil nos apresenta neste momento, portanto, é sua Teologia, isto é, o discurso que Deus nos faz através da juventude. De fato, Deus nos fala pelo jovem. O jovem, nesta perspectiva, é uma realidade teológica, que precisamos aprender a ler e a desvelar. Não se trata de sacralizar o jovem, imaginando-o como alguém que não erra; trata-se de ver o sagrado que se manifesta de muitas formas, também na realidade juvenil. Trata-se de fazer uma leitura teológica do que, de forma ampla, chamamos de culturas juvenis. Numa época em que se fala tanto de inculturação ou – em outros termos – de encarnar-se na realidade, de aceitar o novo, o plural e o diferente, na evangelização da juventude, estaremos diante de feições muito concretas e imprevisíveis. Dizer que, para a Igreja, a juventude é uma prioridade em sua missão evangelizadora, é afirmar que se quer uma Igreja aberta ao novo, é afirmar que amamos o jovem não só porque ele representa a revitalização de qualquer sociedade, mas porque amamos, nele, uma realidade teológica em sua dimensão de mistério inesgotável e de perene novidade.
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44 Um breve resumo do empenho da Igreja na solidariedade com todos se encontra em CNBB, doc. 71, Diretrizes... 2003 - 2006, n. 152-175.
45 Com pequenas oscilações, ambos os grupos se apropriam de 12 a 14% da renda nacional. Os 10% mais ricos se apropriam de cerca de 50% da renda nacional. Cf. Ricardo HENRIQUES (org.), Desigualdade e pobreza no Brasil. IPEA, 2000, p. 21-47.
46 Cf. Lc 15,11ss; Jo 8,1-11; Lc 23,39-43
3. CONSTRUÇÃO DE UMA SOCIEDADE SOLIDÁRIA
76. As Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil afirmam que "participar da construção de uma sociedade justa e solidária constitui um dos objetivos da ação evangelizadora da Igreja no Brasil"44.
77. A evangelização dos jovens não pode visar somente suas relações mais próximas, como o grupo de amigos, a família, a amizade, a fraternidade, a afetividade, o carinho, as pequenas lutas do dia-a-dia. A ação evangelizadora deve também motivar o envolvimento com as grandes questões que afetam toda a sociedade, como a economia, a política e todos os desafios sociais de nosso tempo. Há necessidade de formar o jovem para o exercício da cidadania, como uma dimensão importante do discipulado. A dimensão política e social da fé, contudo, deve ser apresentada aos jovens de maneira que não se reduza a uma ideologia.
78. A sociedade brasileira é, hoje, uma das mais desiguais do mundo. Nas últimas décadas, a renda do 1% mais rico se manteve igual à dos 50% mais pobres45. Tal situação reflete um modelo social que propõe um ideal de consumo ilusório para os pobres, pois tantas vezes se reduz apenas a imagens na televisão ou na propaganda, e efetivo e sofisticado para os ricos. Este modelo alimenta a difusão da violência, resultado dos muitos conflitos e tensões produzidos por um mundo desigual, incapaz de respeitar a dignidade das pessoas. Tal desigualdade, aos olhos do cristão, é um escândalo e, ao mesmo tempo, um desafio, diante do qual não basta protestar ou lamentar, mas é preciso redobrar com lucidez e perseverança o empenho na construção de uma sociedade justa e solidária.
79. O Cristão se identifica com aquele que é o "bom samaritano", que socorre a vítima dos assaltantes, símbolo de toda vítima inocente do mal do mundo, sem se perguntar sobre a raça ou a religião dele. Ele cura inúmeras pessoas, vítimas da doença ou daquelas forças malignas que atacam os seres humanos. Ele traz uma palavra de esperança aos pobres e reparte o pão com eles, promessa de um futuro diferente, de um outro mundo possível. Ele acolhe e perdoa os pecadores. Ele é misericordioso. Estende a mão para levantar o caído, acolhe com abraço o que volta arrependido e vai ao encontro do afastado. Devolve o ser humano às suas tarefas, às suas responsabilidades e à sua dignidade46.

4. PRONUNCIAMENTOS DO MAGISTÉRIO SOBRE A JUVENTUDE

80. O Magistério da Igreja se ocupou muitas vezes da Evangelização da Juventude. Apresentamos alguns ensinamentos da Igreja que podem balizar as atividades que posteriormente queremos propor, em vista de um novo impulso em tão importante tarefa pastoral47 . É saudável e inspirador alimentar-nos do Magistério da Igreja com relação à evangelização da juventude. Claro que seria impossível apresentar tudo o que se fez e se falou sobre juventude, portanto, chamamos atenção aqui somente a alguns textos.
81. João Paulo II, na Christifideles Laici, retomou a riqueza do que o Concílio Vaticano II falou sobre a juventude, afirmando que a Igreja tem tantas coisas para dizer aos jovens, e os jovens têm tantas coisas a dizer à Igreja. Este diálogo recíproco, que deverá fazer-se
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48 Cf. Exortação Apostólica "CHRISTIFIDELES LAICI"46.
49 João Paulo II aos jovens brasileiros em Belo Horizonte (1/7/1980) em A palavra de João Paulo II no Brasil. São Paulo: Paulinas, 1980, pp. 37 e 38.
50 Valemo-nos de "Conclusões de Medellín – II Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano". Uma publicação do Regional Sul 3 da CNBB, 1968. Referimo-nos ao capítulo sobre Juventude, p. 32-37.
51 CNBB, Diretrizes Gerais, doc. 71, n. 198.
52 João Paulo II, Cristifideles Laici, no. 46, Cf. também CNBB Diretrizes gerais..., doc. 61, nn. 236 e 237.
com grande cordialidade, clareza e coragem, favorecerá o encontro e o intercâmbio das gerações, e será fonte de riqueza e de juventude para a Igreja e para a sociedade civil. Na sua mensagem aos jovens o Concílio diz: "A Igreja olha para vós com confiança e amor... Ela é a verdadeira juventude do mundo... Olhai para ela e nela encontrareis o rosto de Cristo"48.
82. Continua atual o desafio lançado por João Paulo II aos jovens brasileiros: "É urgente colocar Jesus como alicerce da existência humana. Os melhores amigos, seguidores e apóstolos de Cristo, foram sempre aqueles que perceberam um dia dentro de si, a pergunta definitiva, incontornável, diante da qual todas as outras se tornam secundárias: ‘Para você, quem sou eu?’A vida, o destino, a história presente e futura de um jovem, depende da resposta nítida e sincera, sem retórica, sem subterfúgios, que ele puder dar a esta pergunta. Ela já transformou a vida de muitos jovens"49.
83. Já em Medellín, o Episcopado da América Latina referia-se à juventude como "uma grande força nova de pressão" e como "um novo organismo social com valores próprios"50. A Igreja vê na juventude a constante renovação da vida da humanidade. A juventude é o símbolo da Igreja, chamada a uma constante renovação de si mesma. Por isso ela quer desenvolver, dentro da pastoral de conjunto, uma autêntica pastoral de juventude, educando os jovens a partir de sua vida, permitindo-lhes plena participação na comunidade eclesial.
84. Em Puebla, o Episcopado faz duas opções preferenciais que marcaram a Conferência: a opção preferencial pelos pobres e pelos jovens. Falando das opções pastorais, a Conferência inicia dizendo que a Igreja confia nos jovens, sendo eles a sua esperança. Por ser dinamizadora do corpo social e especialmente do corpo eclesial, a Igreja faz uma opção preferencial pelos jovens com vistas à sua missão evangelizadora no Continente.
85. Em Santo Domingo, os bispos reafirmam a opção preferencial pelos jovens de Puebla, não só de modo afetivo, mas efetivamente (opção por uma pastoral da juventude orgânica, com acompanhamento, com apoio real, com diálogo, com maiores recursos pessoais e materiais e com dimensão vocacional).
86. O Episcopado Brasileiro ressalta51: "Cuidado particular merecem os jovens, considerando-se a situação que encontram na sociedade de hoje. Ela lhes apresenta uma oferta imensa de experiências potenciais e de conhecimentos, mas não lhes fornece recursos adequados para satisfazer suas aspirações. Além disso, muitas vezes os desvia para caminhos ilusórios de busca do prazer. Os jovens são um grande desafio para o futuro da Igreja", que deve torná-los "protagonistas da evangelização e artífices da renovação social"52.
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53 Estas dimensões podem ser visualizadas no gráfico do anexo 5.
III. LINHAS DE AÇÃO
87. Depois de analisar a realidade e o perfil desta nova geração de jovens, na primeira parte deste documento, e, em seguida, confrontar esta realidade juvenil com os princípios da fé, queremos apresentar alguns desafios, princípios orientadores e linhas de ação que brotam desta realidade e das diversas experiências positivas que já vêm acontecendo em nossa Igreja.
88. "Não fostes vós que me escolhestes; fui eu que vos escolhi" (Jo 15, 16). Do encontro pessoal com Jesus Cristo, nasce o discípulo, e do discipulado nasce o missionário. O encontro pessoal é a primeira etapa. Em seguida, nasce um itinerário, em cujas etapas vai amadurecendo pouco a pouco o compromisso com a pessoa e o projeto de Jesus Cristo, à luz do mistério pascal. Cada etapa abre horizontes ao jovem para definir seu projeto de vida. O jovem aprende a escutar o chamado de Cristo; a buscar uma vida interior de valores evangélicos; a sair do individualismo para pensar e trabalhar com os outros; a participar de uma comunidade eclesial concreta; a se sensibilizar como o bom samaritano com o sofrimento alheio; a participar de uma pastoral orgânica com os outros; a entender que a luta pela justiça é um elemento constitutivo da evangelização; e a se comprometer de maneira decisiva com a missão. Estas etapas devem levar a uma opção vocacional, entendida como vocação de leigo ou vocação de especial consagração, como presbítero ou religioso (a). O que sustenta a caminhada é a graça de Deus.
89. Acreditamos que para responder de maneira qualificada aos anseios da juventude, às necessidades da Igreja e aos sinais dos tempos, necessitamos das seguintes linhas de ação:
• 1ª linha de ação: FORMAÇÃO INTEGRAL DO DISCÍPULO
• 2ª linha de ação: ESPIRITUALIDADE
• 3ª linha de ação: PEDAGOGIA DE FORMAÇÃO
• 4ª linha de ação: DISCÍPULOS PARA A MISSÃO
• 5ª linha de ação: ESTRUTURAS DE ACOMPANHAMENTO
• 6ª linha de ação: MINISTÉRIO DA ASSESSORIA
• 7ª linha de ação: DIÁLOGO FÉ E RAZÃO
• 8ª linha de ação: O DIREITO À VIDA
1ª Linha de Ação: FORMAÇÃO INTEGRAL DO DISCÍPULO
Desafios e princípios orientadores
90. Um grande desafio é a promoção de um processo de evangelização dos jovens que leve em conta as diferentes dimensões da formação integral. O conceito de formação integral é importante para considerar o jovem como um todo, evitando assim reducionismos que distorcem a proposta de educação na fé, reduzindo a fé a uma proposta psicologizante, espiritualista ou politizante53.
91. O discipulado começa com o convite pessoal de Jesus Cristo: "Vem e segue-me (Lc 18,22). Na formação para o discipulado é necessário partir de uma formação integral. Apontamos cinco dimensões que necessitam da atenção de quem trabalha na formação dos jovens: dimensão da personalização, da integração, dimensão teológico-espiritual,
21
54 Cf. CNBB, doc. 71, Diretrizes… 2003 – 2006, nº 113.
social-política e dimensão da capacitação técnica. Trata-se de efetivar, pedagogicamente, um conceito que se encaixa no contexto da sensibilidade da cultura jovem e aponta para uma nova síntese que integra o racional com o simbólico, a afetividade, o corpo, a fé e o universo. Cada uma das cinco dimensões é vista como uma relação que o jovem tem com um aspecto da sua vida e cada um responde às perguntas de fundo que todo ser humano faz, consciente ou inconscientemente.
1. Dimensão psico-afetiva – Processo da personalização:
92. As perguntas de fundo: Qual é a relação comigo mesmo? Quem sou eu? São perguntas de fundo importantes para o autoconhecimento e para a construção da personalidade do jovem. Sem a capacidade de autoconhecimento e autocrítica, o jovem é incapaz de analisar as situações com objetividade, de administrar os conflitos, e de se relacionar com outros de uma maneira equilibrada. Sem esta dimensão torna-se difícil a interiorização, o silêncio interior e o encontro com Deus na oração e a verdadeira conversão.
2. Dimensão psicossocial – Processo de integração:
93. As perguntas de fundo são: Quem é o outro? Como relacionar-se com ele? Essa dimensão acentua a importância das relações entre as pessoas que acontecem, por exemplo, nas amizades, nos grupos, na vida em comunidade, na família. A felicidade do jovem depende da sua capacidade de comunicar-se com os outros.
94. A amizade é algo natural e importante na vida do jovem. Frente a uma cultura contemporânea que incita à concorrência, o Evangelho propõe um relacionamento baseado no amor e no serviço.
95. A evangelização da nova geração de jovens não pode permanecer somente no nível das idéias e da formação teórica. Não se constrói a comunidade cristã somente com idéias. Há necessidade de descer ao nível da afetividade, de viver relações de fraternidade voltadas para o discipulado. "Nosso esforço será criar condições para que as pessoas possam viver relações de solidariedade e de fraternidade que permitam sua maior realização, no contexto atual"54. Comunidade pressupõe amizade, calor humano, a aproximação afetiva e um projeto de vida em comum.
96. Essa dimensão, então, busca motivar o jovem para o envolvimento na comunidade eclesial. Na medida em que ele se sente valorizado em suas capacidades, consegue perceber o valor de se caminhar com aqueles que partilham da mesma fé em Jesus Cristo. Além do mais, pouco a pouco, vai se envolvendo nas suas atividades e se corresponsabilizando na sua missão. Os Atos dos Apóstolos descrevem a comunidade dos primeiros cristãos como sendo "um só corpo e uma só alma" (At 4,32), e isto o jovem vai sentindo na convivência.
97. Um aspecto importante da vida dos adolescentes e dos jovens é a sexualidade. A sexualidade foi criada por Deus para a comunhão e é uma das descobertas mais vibrantes que o jovem vive, na busca do divino que nele existe. Os jovens vivem, hoje, em um ambiente erotizado em que a sexualidade é, infelizmente, banalizada e freqüentemente transformada em meio egoísta de prazer e de manipulação e corrupção das relações mais profundas entre as pessoas. Neste contexto é importante desenvolver um programa de educação sexual que integre a sexualidade em um projeto mais amplo de crescimento e maturidade onde ela: seja baseada na liberdade e não no medo; leve em conta as exigências da ética cristã; leve ao amor e à responsabilidade; desperte para a auto-estima,
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principalmente, no cuidado com o corpo do próprio jovem e dos outros; tenha Deus, criador da vida, da sexualidade e da alegria, como sua fonte de inspiração.
98. Um dos importantes espaços de formação acontece no relacionamento familiar. Atingida por tantos fatores externos, nem sempre a família é capaz de cultivar valores essenciais para vida. O jovem, então, exercitando o amor, o perdão, a paciência, o diálogo, o serviço no seio dela vai amadurecendo como pessoa e, enquanto se forma, vai, ele mesmo, sendo portador de tantos valores em benefício da mesma.
3. Dimensão Mística – Processo teológico-espiritual
99. As perguntas de fundo que o jovem se faz são: Qual é a minha relação com Deus? De onde vim? Para onde vou? Qual o sentido da minha vida? Qual o sentido da morte? Qual o sentido do sofrimento?
100. O ser humano foi feito para um horizonte mais amplo do que o bem-estar material. O teológico e o espiritual não só caminham juntos, mas se complementam. A dimensão teológica é cultivada no estudo, na catequese e no aprofundamento dos dados básicos da fé. Desse aprofundamento fazem parte a iniciação à leitura da Palavra de Deus, do conhecimento de Jesus Cristo e da Igreja. A dimensão espiritual corresponde à experiência de Deus. Isso pode ser feito através de retiros, da vivência sacramental e da oração. Não basta estudar Deus; é necessário também ter uma experiência de Deus. A relação com Deus está também presente nas outras dimensões e as ilumina.
4. Dimensão Política – Processo de participação-conscientização
101. As perguntas de fundo do jovem são: Qual a minha relação com a sociedade ao meu redor? Como organizar a convivência social? Podemos mudar a sociedade? A consciência da cidadania faz ver que todo poder emana do povo e em seu lugar é exercido. Essa dimensão abre o jovem para os problemas sociais em nível nacional e internacional: problemas de moradia, saúde, alimentação, a má qualidade da educação, direitos humanos desrespeitados, discriminação contra a mulher, violência, guerra, ecologia. Não se pode pregar um amor abstrato que encobre os mecanismos econômicos, sociais e políticos geradores da marginalização de grandes setores de nossa população. Aqui há necessidade de formar o jovem para o exercício da cidadania. Há necessidade de conectar a fé com a vida, a fé com a política.
5. Dimensão Técnica – Processo de capacitação-metodologia
102. As perguntas de fundo do jovem: Qual é a minha relação com a ação? "A fé sem ação," diz São Tiago, "está morta". Como trabalhar? Como me organizar através de um consistente projeto pessoal de vida? Como administrar meu tempo? Como organizar as estruturas de coordenação que facilitam o acompanhamento sistemático, a comunicação, o aprofundamento e a continuidade? Como coordenar uma reunião de grupo e assegurar conclusões concretas? Como montar um curso? Como avaliar e acompanhar sistematicamente, no dia-a-dia, os processos grupais de educação na fé? Como planejar e avaliar a ação evangelizadora? As habilidades são necessárias para acompanhar as estruturas de apoio para o processo de evangelização dos jovens. Sem estas habilidades, os projetos pastorais não caminham.
Pistas de Ação 23
103. Avaliar periodicamente a situação pastoral para verificar se todas as dimensões da formação integral estão sendo contempladas, no processo de evangelização dos jovens, identificando as lacunas a serem preenchidas.
104. Fazer um trabalho de conscientização vocacional, ajudando o jovem a definir e a elaborar o seu Projeto de Vida, contemplando todas as dimensões da formação.
105. Organizar uma Catequese de Crisma que, estando atenta à formação integral dos jovens, procure oferecer-lhes, já enquanto estão no processo catequético, oportunidades significativas de vivência grupal, de atividades comunitárias, de meditação da Palavra de Deus, de experiência de oração etc.
106. Mobilizar as escolas para que elas garantam em todo o processo pedagógico uma formação integral dos jovens.
107. Envolver as famílias nos diferentes programas da ação evangelizadora, orientando-as a contribuírem de forma mais intensa na educação da fé de seus filhos.
2ª Linha de Ação: ESPIRITUALIDADE
Desafios e princípios orientadores:
108. A rapidez das mudanças, os atrativos de diferentes níveis e a agitação do cotidiano dificultam a vivência de uma verdadeira espiritualidade. Muitos jovens não vivem num contexto cristão, numa família cristã, não foram iniciados na fé.
109. Por isso, todos nós – pastores, agentes de pastoral, educadores de jovens, pais de família, lideranças – perguntamos: como provocar no jovem o desejo do seguimento ao Senhor, proposta de vida plena e presente de Deus para os que o seguem? Como motivá-lo a uma espiritualidade compreensível e acessível, cheia de sentido, gosto, orientação, segurança e alegria de viver?
110. A vocação à santidade e a certeza de que a juventude é um lugar teológico da comunicação de Deus, exigem da Igreja uma proposta de espiritualidade como caminho que dê sentido à vida, em um constante diálogo com o Pai, através de Jesus, no Espírito Santo. Consoante com os tempos e com as características juvenis, a espiritualidade proposta aos jovens deve contemplar a alegria, o movimento, expressão corporal, a música, os símbolos, o envolvimento com a vida, a amizade, a convivência, a espontaneidade etc.
111. Entendendo a espiritualidade como motivação central e bússola para orientar a vida, na direção da vontade de Deus, propomos aos jovens uma espiritualidade: centrada em Jesus Cristo e no seu projeto de vida; acolhedora do cotidiano como lugar privilegiado de crescimento e santificação; alegre e cheia de esperança; marcada pela experiência comunitária onde se medita a Palavra de Deus e se celebra a Eucaristia; apoiada no modelo do ‘sim’ de Maria e na certeza de sua presença materna e auxiliadora; conduzida pelo compromisso com o Reino, traduzida no compromisso com a transformação social a partir da sensibilidade diante do sofrimento do próximo.
112. Para alimentar constantemente a espiritualidade cristã o jovem necessita encontrar instrumentos, pessoas e momentos que o marque profundamente, provocando nele o desejo de verdadeira mudança. Estes meios colocam o jovem num processo constante de revisão de vida e de discernimento vocacional diante de Deus e diante do mundo. Além disso, o jovem que, ao optar pelo Senhor, assume uma nova postura diante da vida é, naturalmente, percebido, notado, admirado e seguido pelos seus companheiros: "jovens
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evangelizando jovens". Entre tantos meios para este exercício cotidiano de crescimento na fé, destacamos:
113. A oração pessoal: O diálogo pessoal, íntimo, profundo com Jesus Cristo, no Espírito Santo, nos fortalece na dignidade de filhos diante do Pai. O jovem é criativo quando se sente à vontade com Deus e amado por Ele. Olhando para Jesus que não se cansava de rezar ao Pai, principalmente nos momentos de maiores decisões, o jovem se sente motivado a fazer o mesmo. Além do mais, tudo pode ser matéria de oração e de conversa com aquele que só deseja a entrega total, irrestrita, constante a ele e, por isso, doação aos irmãos e irmãs. A sintonia com Jesus Cristo cura as feridas, corrige os passos, orienta a vida, perdoa os pecados, acorda do comodismo e da inércia, critica as omissões e dá a alegria de viver. Não dá para ser de Cristo se não se reservam momentos especiais para estar com Ele. Este contato amigo anima à conversão, à retomada do projeto de vida, ao desejo de santidade, ao discernimento vocacional, ao compromisso com os mais pobres e sofredores, ao envolvimento na comunidade, ao fortalecimento da fé, da esperança e do amor.
114. A oração comunitária: Nem sempre é fácil rezar com os outros, mas sabemos o quanto isto é importante para a espiritualidade cristã. Em comunidade, eleva-se a Deus uma voz uníssona. Juntos louvamos, pedimos, agradecemos, choramos, cantamos, silenciamos. Em comunidade, apresentamos a Deus os sucessos, as fraquezas, os sonhos, as lutas do povo. As muitas celebrações são momentos fortes de espiritualidade. Entre elas, destacamos a missa dominical. Ela ultrapassa os dias, as preocupações, as frustrações, os problemas, o cansaço, tão presentes na rotina dos outros dias da semana. Domingo é o dia de encontrar-se com os outros jovens e irmãos, também eles desejosos de novas respostas e forças para o seu cotidiano. É preciso recuperar o domingo como um dia especial de revigoramento espiritual.
115. A participação na comunidade: Desde o início da História da Salvação Deus forma um povo e vai se comunicando com ele, num processo constante de diálogo, convite à conversão e ao compromisso, com promessas de felicidade e fidelidade. Deus quis salvar a pessoa não isoladamente, mas participante de um povo que o conhecesse na verdade e santamente o servisse (LG 9). A espiritualidade da comunhão fraterna é essencial na vida cristã e todo jovem é convidado, desde cedo, a fazer esta experiência fundante da fé através de seu envolvimento nas diversas responsabilidades assumidas na comunidade. O nosso testemunho de unidade, cultivado no exercício de cada membro de uma mesma comunidade, mostrará ao mundo a força transformadora da religião bem vivida. Ao lado dos outros, descobrimos não só o que temos de comum ou de diferente, mas acreditamos na comunicação de Deus que se serve de todos para falar a todos.
116. A leitura orante da Sagrada Escritura: Deus, querendo deixar registrado na história todo o seu Projeto e sua vontade, serviu-se de várias pessoas para escreverem as experiências, as maravilhas, as quedas, as lutas, as fraquezas e as conquistas do seu povo. Quanto mais mergulhamos nas Escrituras, mais nos identificamos com este povo e adquirimos entendimento do que somos, para onde vamos e o que devemos fazer. Nas Sagradas Escrituras entra-se em contato com o povo que – seguro da escolha de Deus – nunca desanima e sempre se mostra criativo para enfrentar o mundo e propor novos caminhos. Jesus Cristo – a Palavra de Deus por excelência – ao se colocar como ‘Caminho, Verdade e Vida’ (Jo 14, 6) nos convida a conhecê-lo profundamente. Assim, crer na Palavra de Deus é essencial para um processo de crescimento do jovem que quer se comprometer cada vez mais com este projeto do Criador.
117. A vivência dos Sacramentos: De maneira toda especial encontramo-nos com Jesus na celebração dos sacramentos. O jovem, batizado, desejoso de se tornar adulto na fé,
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descobre, através da preparação e da celebração do Sacramento da Crisma, uma ocasião de receber os dons do Espírito Santo e de ser ungido, isto é, consagrado para a missão. É importante que esta preparação leve o adolescente e o jovem a ter uma experiência comunitária da fé! Animado porque a Igreja reconhece este grau de maturidade, o jovem se alimenta constantemente da misericórdia de Deus e do Pão descido do céu. O sacramento da Reconciliação, preparado de maneira adequada e jovial, é capaz de envolver e regenerar aquele que, nesta fase delicada da vida, se sente bastante agredido, atormentado, seduzido por tantos contra-valores da sociedade comodista e hedonista. Deus que perdoa, também oferece um alimento eficaz ao jovem fraco e frágil: o Corpo e o Sangue de seu amado Filho Jesus. A evangelização da juventude precisa ter um coração eucarístico! A comunhão eucarística, o exercício da adoração ao Santíssimo e tantas outras manifestações litúrgicas revigoram a vida do jovem e o incentivam a ser, também ele, pão para as necessidades do próximo.
118. A devoção a Nossa Senhora: o reconhecimento da presença materna de Maria se desenvolve a partir das celebrações litúrgicas e das diversas expressões da piedade popular. Entre elas destaca-se a reza do terço com o qual, enquanto o jovem se sente abraçado pela Mãe, medita os mistérios da Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus. De grande valia são também as celebrações e as festas marianas, as peregrinações aos santuários de Nossa Senhora, as procissões em sua homenagem. Ao mesmo tempo em que a comunidade em suas orações apresenta os jovens a Maria, ela, também, apresenta Maria aos jovens.
119. Os diversos encontros espirituais: nossa tradição eclesial comprova o valor perene de momentos especiais para os jovens e com os jovens, cuja finalidade é a formação e a espiritualidade. Encontros, jornadas e manhãs de formação são capazes de congregar muitos jovens interessados em encontrar algo mais profundo, desafiador, envolvente. Palestras bem ministradas e o clima de amizade são capazes de mexer com a vida dos jovens dando-lhes rumo, segurança, serenidade. Os diversos tipos de retiros, vigílias, celebrações provocam nos jovens grandes questionamentos e desejo de mudança de vida, principalmente quando são confrontados com a pessoa e a proposta de Jesus Cristo. Estes momentos devem ser bem organizados e conduzidos, de maneira que as várias dimensões da vida sejam contempladas, e não se tornem demasiadamente emocionais ou reivindicativas. Outras ocasiões fortes de espiritualidade juvenil podem ser as romarias, caminhadas, peregrinações, acampamentos que, pedagogicamente, ensinam e vivenciam valores como o sacrifício, a renúncia, a perseverança. Sabendo que os jovens vivem aí momentos de abertura e acolhida, precisamos ser criativos nos convites, nas propostas, na linguagem e na condução destes momentos de graça.
120. As leituras e reflexões: são de grande valia as leituras teológicas e espirituais como instrumento para o fortalecimento e o crescimento da fé. A leitura da vida dos santos e de seus escritos pode contribuir enormemente para despertar ou alimentar a vida dos jovens que hoje, mais do que nunca, sentem necessidade de modelos, líderes, testemunhos. Na história da nossa Igreja temos muitos santos jovens como, por exemplo: Inês, Tarcísio, Domingos Sávio, Pancrécio etc. A devoção aos santos lembra aos jovens a sua vocação à santidade.
Pistas de ação
121. Orientar o jovem sobre o valor da oração pessoal, tornando-a, pouco a pouco, um hábito de vida.
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122. Proporcionar aos jovens uma liturgia que contemple alegria e profundidade, espontaneidade e respeito, passado e presente, silêncio e movimento, linguagem nova e tradição.
123. Motivar o jovem para a participação da Eucaristia dominical.
124. Motivar nos jovens a abertura para a irrenunciável dimensão ecumênica da vida cristã.
125. Envolver os líderes jovens nas diversas instâncias de decisão e organização comunitária, inclusive nos diversos Conselhos.
126. Favorecer acesso, compreensão, instrumentos adequados, cursos para que o jovem possa aprofundar as Sagradas Escrituras.
127. Incentivar a Leitura Orante da Palavra de Deus (Lectio Divina) com os jovens, principalmente com as lideranças juvenis.
128. Oferecer de maneira criativa e atraente roteiros de formação para os sacramentos da iniciação cristã e da penitência.
129. Oferecer meios formativos que proporcionem gradativamente aos jovens acolhida consciente dos sacramentos do Matrimônio ou da Ordem.
130. Apresentar Maria aos jovens, principalmente no mês de maio e nas festas marianas, mostrando-lhes a coragem de alguém que pautou sua vida segundo o Projeto de Deus.
131. Organizar encontros de formação espiritual e retiros com os jovens.
132. Facilitar a circulação ou aquisição de livros, subsídios e filmes de homens e mulheres que responderam positivamente ao chamado à santidade.
3ª Linha de Ação: PEDAGOGIA DE FORMAÇÃO
Desafios e princípios orientadores
133. Há necessidade de desenvolver uma pedagogia de formação que conquiste e envolva os jovens num itinerário que os leve ao amadurecimento na fé
134. A Igreja enfrenta o desafio de evangelizar uma geração com características diferentes das gerações anteriores. Trata-se de uma geração formada pela imagem, acostumada com estímulos constantes para manter sua atenção, para quem o "sentir" é mais importante do que o "pensar", que, às vezes, tem um "eu" muito fragilizado, com aversão a compromissos de longo prazo, aberta à dimensão espiritual da vida, mas freqüentemente rejeita a religião institucionalizada.
135. Por outro lado, na sua vulnerabilidade, essa juventude possui um grande potencial. Para abrir a porta deste potencial e deixar desabrochar o idealismo e o espírito de doação natural do jovem, há necessidade de uma chave pedagógica. Trata-se do conjunto de métodos usados que envolvem a maneira de ser, de viver e de comunicar-se dos agentes de evangelização. Há necessidade de uma pedagogia para chegar aos jovens e envolvê-los num itinerário que os leve ao amadurecimento na fé.
136. Para evangelizar esta nova geração de jovens que descrevemos anteriormente contamos com a rica experiência acumulada e sistematizada pela Igreja na América Latina e no Brasil, e salientamos algumas pistas de ação:
1. Prioridade da experiência sobre a teoria 27
55 Catequese Renovada no 89; cf 92-98.
137. No contexto da cultura contemporânea, a formação teórica é normalmente o ponto de chegada e não de partida. O primeiro passo no processo de evangelização é criar interesse da parte do jovem. Para isso, partimos das suas necessidades e aspirações e usamos uma linguagem que tenha significação para ele. Esta pedagogia inspira-se no método usado por Jesus (mulher samaritana – Jo 3, 1-22, discípulos Emaús – Lc 24, 13-35, Nicodemos – Jo 3, 1-22, Zaqueu – Lc 19, 1-9).
138. Trata-se de caminhar e dialogar com os jovens, partindo das suas vidas e preocupações, iluminando estas preocupações com a dimensão da fé, e incentivando a uma ação concreta de mudança pessoal ou de situações. A evangelização dos jovens exige uma nova linguagem para se comunicar com eles. Nesta tarefa, o método Ver-Julgar-Agir-Celebrar pode ser uma ferramenta importante.
139. Integrar o racional com o simbólico, a afetividade, o corpo e o universo. Esta abordagem deve estar presente nos diferentes momentos de formação dos jovens: na vida dos grupos, nas reuniões de coordenação, nos cursos, nos retiros, nas celebrações e nas atividades desenvolvidas em conjunto. Para esta finalidade é importante a acolhida, a experiência de fraternidade, a utilização da música, dos testemunhos pessoais nas palestras, das dinâmicas e dos simbolismos. Para muitos jovens o encontro com Jesus Cristo, passa, num primeiro momento, pela vida afetiva, no sentir-se acolhido e estar num ambiente de alegria e amizade.
140. Recomendamos este método definido no documento da Catequese Renovada como "princípio metodológico da interação fé e vida. "Na catequese realiza-se uma inter-ação (= um relacionamento mútuo e eficaz entre a experiência de vida e a formulação da fé, entre a vivência atual e o dado da Tradição). De um lado, a experiência da vida levanta perguntas; de outro, a formulação da fé é busca e explicitação das respostas a essas perguntas. De um lado, a fé propõe a mensagem de Deus e convida a uma comunhão com ele; de outro, a experiência humana é questionada e estimulada a abrir-se para esse horizonte mais amplo"55.
2. Pedagogia de pequenos grupos e eventos de massa
141. Há necessidade de trabalhar em duas frentes ao mesmo tempo, assim como Jesus trabalhava: os pequenos grupos e os eventos massivos.
142. Os grupos de jovens são um instrumento pedagógico de educação na fé. O pequeno grupo, como instrumento de evangelização, foi uma dos instrumentos pedagógicos usados por Jesus ao convocar e formar seu grupo de doze apóstolos. Estes grupos estão inseridos nas Comunidades paroquiais ou nas Comunidades Eclesiais de Base.
143. Ao mesmo tempo, os eventos massivos exercem uma função importante no processo de evangelização dos jovens. Criam visibilidade e conquistam credibilidade, tanto na Igreja quanto na sociedade e injetam ânimo e entusiasmo nos jovens e assessores.
144. Os "eventos de massa" mais conhecidos são as Jornadas Mundiais da Juventude convocadas pelo Papa de dois em dois anos e que reúnem jovens provenientes de todas as regiões do mundo. No Brasil, desde 1986, realiza-se o Dia Nacional da Juventude que, em lugares variados, mobiliza mais de um milhão de jovens a cada ano. Em nível local, há uma variedade de eventos. Alguns deles são promovidos pelos Movimentos, como por exemplo os que são realizados pelo Focolare e pela Renovação Carismática Católica. Os
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eventos de massa têm metodologia variada: celebrações, pregação, testemunhos,teatro, caminhadas, oficinas, gincanas, conjuntos musicais, trio elétrico, palestras.
145. Não se pode cair na tentação de reduzir a evangelização da juventude unicamente a eventos massivos. Quando estes eventos não estão ligados a um acompanhamento sistemático de educação na fé, os efeitos duram pouco. Há necessidade de envolver os pequenos grupos na fase anterior e posterior para garantir que os eventos de massa se integrem num processo contínuo de educação na fé.
146. A metodologia de eventos massivos exige uma metodologia diferente daquela de acompanhamento dos pequenos grupos e da pastoral ordinária. Exige preparação a longo, médio e curto prazo e diferentes equipes de serviço. O número de eventos durante o ano deve ser limitado para não esgotar os recursos humanos e financeiros necessários para o acompanhamento da pastoral ordinária.
3. Níveis de evolução do processo de acompanhamento dos jovens
147. O acompanhamento dos jovens passa por diferentes níveis de evolução. Conhecer os níveis de evolução facilita o diagnóstico pastoral e a análise da situação da evangelização da juventude em uma diocese e as lacunas que precisam de mais atenção. Um nível superior não elimina o nível inferior. Uma visão de níveis de evolução é importante para manter o olhar no quadro maior e não se perder em peculiaridades e detalhes secundários. Os níveis que se complementam são os seguintes:
1. Prestação de serviços:
148. Neste primeiro nível, o assessor diocesano ou equipe de coordenação organiza serviços para jovens: palestras, cursos de fim de semana, encontros, eventos massivos, passeios. Não há, ainda, um itinerário de educação na fé com acompanhamento sistemático. Este nível é importante, porém, tem suas limitações. A limitação deste nível é a ausência de protagonismo dos jovens e a falta de continuidade.
2. Organização de grupos de jovens:
149. Os grupos de jovens são um recurso pedagógico na educação na fé e também representam um passo à frente em termos de continuidade. Sem a nucleação em grupos ou equipes de serviço, o assessor é obrigado a acompanhar os jovens individualmente – uma tarefa que se torna impossível em larga escala. A preparação deve ser bem feita e os acompanhantes capacitados para que os grupos sejam um espaço privilegiado de crescimento e de formação. As grandes limitações desta etapa são as dificuldades causadas pelo isolamento dos grupos.
3. Organização dos grupos em uma rede:
150. As estruturas de coordenação facilitam a organização de uma rede de grupos através da qual é possível deslanchar processos e não mais atividades isoladas. Agora é possível para o assessor e o coordenador jovem acompanhar processos grupais de educação na fé. Os processos são sustentados por diferentes instrumentos pedagógicos: comissões de coordenação em diferentes níveis, acompanhamento sistemático de pessoas, grupos e coordenações, processo de planejamento participativo e avaliações periódicas. As promoções (cursos, retiros, celebrações, palestras, ações, atividades de lazer) são agora integradas e fortalecem um processo de crescimento. A principal limitação deste nível é a falta de objetivos claros que canalizem as forças na mesma direção.
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4. Necessidade de um projeto pastoral compartilhado:
151. Neste nível de evolução há um projeto pastoral compartilhado que determina a identidade da pastoral ou movimento: modelo de jovem a ser formado, tipo de espiritualidade, a imagem, de Deus e da Trindade, modelo de Igreja, relação Igreja-sociedade, relação bíblia-vida, relação fé-vida, fé-política, a maneira de celebrar. Hoje, os processos são muito rápidos e os jovens ficam menos tempo nos grupos e equipes de coordenação. Como resultado, freqüentemente uma geração de líderes não passa a clareza do projeto para a nova geração. Dentro deste contexto de mudanças, necessitamos pensar em maneiras mais rápidas para passar a clareza teórica do projeto pastoral para os assessores e coordenadores jovens. A grande limitação deste nível é a falta de clareza das etapas a serem percorridas.
5. Crescimento por etapas:
152. Neste último nível de evolução há uma consciência que todo crescimento humano, incluindo o crescimento na fé, passa por etapas. A educação na fé não acontece numa reunião ou num encontro de fim de semana, por melhores que sejam, mas é um processo que leva tempo e é gradual.
Pistas de Ação
153. Promover em todos os níveis de organização uma pedagogia que favoreça o crescimento afetivo entre os jovens.
154. Proporcionar momentos de avaliação para detectar as lacunas pedagógicas na condução do processo de educação na fé dos jovens.
155. Capacitar os assessores e coordenadores dos grupos e equipes de coordenação a partir da pedagogia de Jesus com seus apóstolos: convivência, oração e planejamento em comum.
156. Promover cursos na área da pedagogia da formação para que haja maior profissionalização e clareza metodológica da parte dos jovens e agentes de pastoral que estão conduzindo o processo de evangelização dos jovens.
157. Incentivar o hábito de leitura de artigos, livros e documentos que possam esclarecer a pedagogia a ser usada em diferentes situações.
158. Organizar, valorizar e acompanhar os Grupos de Jovens nas Comunidades.
159. Avaliar periodicamente em que estágio se encontra cada Grupo de Jovens, oferecendo-lhe pistas concretas que contribuam com a sua evolução.
160. Organizar Eventos de Massa, envolvendo as várias forças que trabalham com a juventude local (Movimentos, Pastorais da Juventude, Congregações Religiosas, Grupos de Crisma, Pastoral Vocacional, Pastoral Familiar, Escolas, etc.), principalmente o Dia Nacional da Juventude, no último domingo de outubro. Valorizar o Dia Mundial da Juventude que acontece no Domingo de Ramos.
161. Envolver gradativamente os jovens em atividades próprias da comunidade de fé, favorecendo-lhes experiência de solidariedade, partilha e co-responsabilidade.
162. Organizar experiências significativas para a prática do Voluntariado.
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56 "Entre essas realidades temporais, não se pode deixar de salientar com ênfase especial a atividade política. Esta abarca um vasto campo, desde a ação de votar, passando pela militância e liderança em algum partido político, até o exercício de cargos públicos em diversos níveis." (Puebla 791).
57 Setor Juventude CNBB. (1996). Missão Jovem: um jeito jovem de evangelizar, São Paulo: CCJ
4ª Linha de Ação: DISCÍPULOS PARA A MISSÃO
Desafios e princípios orientadores
163. Na evangelização da juventude deve-se estar atento ao conjunto da população jovem e não se restringir apenas àqueles que já são atingidos pela ação pastoral da Igreja. Freqüentemente os grupos de jovens e suas coordenações se fecham dentro de um pequeno círculo de amigos e conhecidos. Os jovens organizados na Igreja são uma pequena parcela da população jovem. É preciso estimular em todos o espírito missionário para que saiam em missão para levar os outros jovens a um encontro pessoal com Jesus Cristo e o projeto de vida proposta por ele. Esta é também tarefa de toda a comunidade eclesial.
164. Quando o jovem assimila o Evangelho como uma Boa Notícia, ele quer partilhá-la com os outros. O discípulo se torna missionário. O jovem, como apóstolo de outros jovens, tem um poder de comunicação e de convencimento que o adulto não possui. O segredo para atingir os jovens que estão "fora" é mobilizar os jovens que estão "dentro".
165. A missão não se reduz apenas a trazer os jovens para as atividades da Igreja, mas também para que assumam seu papel na sociedade. Há o desafio de trabalhar a dimensão social da fé com os jovens como um elemento da missão do cristão. A luta pela justiça é um elemento constitutivo da evangelização. O jovem cristão é desafiado a trabalhar com todas as pessoas de boa vontade – independente da sua opção religiosa – para construir uma sociedade justa e fraterna, uma sociedade querida por Deus. Participar da construção de uma sociedade justa e solidária constitui um dos objetivos da ação evangelizadora da Igreja no Brasil. Isto inclui também o engajamento político56.
166. Uma grande parte dos jovens não está envolvida nas formas tradicionais de exercício da ação social e política. Muitos não acreditam na possibilidade de um projeto coletivo capaz de garantir mais justiça para a sociedade brasileira e privilegiam a busca de soluções para seus problemas e ambições pessoais. Não obstante, um setor significativo da juventude sonha com a utopia de um outro mundo possível. Na maioria das experiências massivas que clamam por mudanças na sociedade e por uma outra globalização há uma grande presença da juventude.
Pistas de ação
167. Divulgar o projeto "Missão Jovem", já existente em alguns lugares do país, para que se realize em outras regiões e dioceses57.
168. Mobilizar os jovens da comunidade eclesial para que se tornem missionários nos ambientes em que estão inseridos e naqueles em que apresentam maiores desafios, investindo no trabalho diferenciado junto às juventudes: estudantes, universitários, ribeirinhos, negros, agricultores, emprobrecidos, das periferias das grandes cidades, dependentes químicos, envolvidos no mundo da violência e das gangues e outros segmentos juvenis.
169. Incentivar os jovens da Comunidade eclesial a convidarem outros jovens para participarem de suas atividades.
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58 Celam. (1977). Civilização do Amor Tarefa e Esperança, Orientações para a pastoral da Juventude Latino-americana. São Paulo: Paulinas, P. 248.
170. Despertar gradualmente os jovens para a consciência da cidadania e o engajamento sócio-político na transformação da sociedade, a partir da opção evangélica pelos pobres.
5ª Linha de Ação: ESTRUTURAS DE ACOMPANHAMENTO
Introdução
171. A evangelização da juventude passa pelo fortalecimento das estruturas organizativas que acompanham os processos de educação na fé.
172. A organização da evangelização da juventude apresenta dois desafios:
a) Fortalecer as estruturas organizativas que acompanham os processos de educação na fé dos jovens.
b) Organizar uma coordenação mais ampla – Setor Juventude – que envolva todas as forças que trabalham com jovens.
a) O Desafio de fortalecer as estruturas organizativas
Desafios e princípios orientadores
173. Não há dúvida que existe uma crise nas estruturas de organização dos grupos de jovens das paróquias e comunidades que se articulam em níveis diocesanos, regionais e nacional. Estas estruturas são importantes para acompanhar os processos grupais de educação na fé dos jovens. A crise é provocada por diferentes fatores: uma nova cultura mais individualista, a ausência de assessores adultos, de pessoas liberadas e pouca disponibilidade de investimento, falta de infra-estrutura para o trabalho.
174. A organização é um instrumento importante para a evangelização dos jovens, tanto para as Pastorais da Juventude como para os Movimentos Eclesiais. Ela garante a eficácia dos projetos de formação. Sem a organização e a articulação entre si, numa rede de grupos, o assessor se vê obrigado a acompanhar os jovens individualmente, o que se torna muito difícil. Sem a organização, os grupos se fecham numa visão limitada e superficial. Não se despertam lideranças e experiências valiosas nascem e morrem. Não se acumulam e não se sistematizam experiências. Na base do trabalho evangelizador com a juventude, o assessor adulto ou o jovem coordenador é obrigado a criar tudo sozinho, sem contar com apoio e experiência de fora.
175. Como parte fundamental de sua missão, a pastoral "organiza-se a partir da base, gerando um processo dinâmico de comunhão e participação e criando estruturas de coordenação, animação e acompanhamento que permitem o intercâmbio entre as experiências que se realizam nos diferentes níveis da Igreja: grupos, paróquias, áreas pastorais dioceses, país, região e continente"58 para, assim, realizar, organicamente, sua missão evangelizadora, como pediam os bispos em Puebla.
176. Há um aumento da motivação por parte dos jovens ao perceberem que fazem parte de um projeto mais amplo, em que as estruturas participativas promovem o protagonismo dos jovens, aumentam a motivação e compromisso. Participando na organização, o jovem se sente sujeito do processo da sua própria educação na fé. O jovem, então, se envolve para
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59 Idem
evangelizar outros jovens, pelo seu testemunho de vida e pelo anúncio explícito do Senhor Jesus.
177. Participando das estruturas da organização, o jovem desenvolve importantes habilidades de liderança, capacidade de escutar os outros, de superar a timidez e falar em público, de organizar e comunicar suas idéias de maneira sistematizada, de conduzir uma reunião, de analisar criticamente a sociedade ao seu redor, de motivar e acompanhar processos individuais e grupais, de planejar e avaliar a ação pastoral. "A organização favorece a formação na ação dos jovens, gera espaços de diálogo e de decisão para a condução co-responsável de toda a ação pastoral e educa sua inserção na sociedade para fomentar, a partir daí, as urgentes mudanças de estruturas que se fazem necessárias"59.
178. A participação nas estruturas de coordenação é uma maneira eficaz de viver a espiritualidade do Evangelho. Frente ao individualismo da cultura contemporânea, o jovem aprende a vivenciar o mandamento novo trabalhando em equipe com os outros. Aprende a humildade e a capacidade de dialogar. No meio dos conflitos vê-se obrigado a aceitar as críticas, a escutar as opiniões dos outros, a entender a perspectiva dos outros, ser podado para crescer mais. Aprende que não pode impor seus conceitos, que é preciso abrir os horizontes para escutar outros fatos e outras evidências. A participação nas estruturas da organização é uma maneira para mudar mentalidades e comportamentos. O ambiente cultural que educa o jovem para o individualismo é combatido na prática cotidiana dos grupos e equipes de coordenação. As estruturas organizativas precisam ser avaliadas e atualizadas em vista da missão e do serviço.
b) Organizar uma coordenação mais ampla
Desafios e princípios orientadores
179. Há uma multiplicidade de experiências na evangelização da juventude no Brasil, cada uma com sua organização e espaços de formação e atuação. Há necessidade de uma coordenação mais ampla - Setor Juventude - para unir forças num trabalho de conjunto, à luz das Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil. Todas nascem da necessidade de organizar, planejar e avaliar a ação evangelizadora, tanto na comunidade como nos diferentes meios em que os jovens vivem. Tem sua própria mística, metodologia, identidade e organização:
• As Pastorais da Juventude que acompanham os processos de evangelização da juventude a partir dos grupos de jovens;
• Os Movimentos Eclesiais e Novas Comunidades com seus carismas específicos;
• As Congregações Religiosas que trabalham com a juventude, segundo os respectivos Carismas;
• Outras organizações eclesiais que também trabalham com jovens, como Pastoral da Crisma, Catequese, Pastoral Vocacional, Pastoral da Educação, ao lado de outras.
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60 O termo "Pastorais da Juventude" (ou PJB) significa o conjunto das específicas: PJ (Pastoral da Juventude – com os grupos de jovens das paróquias e comunidades), PJMP (Pastoral da Juventude do Meio Popular), PJR (Pastoral da Juventude Rural) e PJE (Pastoral da Juventude Estudantil).
61 PJs, Movimentos e Congregações, Institutos
62 CNBB, Doc. "Unidade e Pluralismo na Igreja"
180. O termo Pastoral da Juventude tem sido usado de maneira ambígua. Por um lado, significava as pastorais específicas60 com jovens que têm como base os grupos paroquiais e de outros ambientes. Por outro lado, o termo tem sido usado, para significar a coordenação ampla de todas as forças61 que trabalham com a evangelização da juventude na Igreja local. Esta ambigüidade inclusive está presente em documentos da CNBB e do CELAM. A Nova nomenclatura "Setor Juventude" está sendo usado para significar o segundo sentido e eliminar a ambigüidade e adequar melhor as estruturas organizativas à nova realidade.
181. "A Igreja é uma em pluralidade de situações, de vocação, de serviços, que não se opõe à unidade mais profunda em Cristo. Em sua diversidade, e não apesar dela, é que os homens são um em Cristo e no Povo de Deus"62. A proposta é fortalecer e ampliar a ação evangelizadora da Igreja e não perder riquezas conquistadas que já provaram seu valor pedagógico e teológico no campo da evangelização da juventude. O pluralismo de carismas e metodologias, vivido na unidade, fortalece a ação evangelizadora.
182. O trabalho em conjunto deve respeitar os carismas, mas, ao mesmo tempo, estabelecer algumas linhas pastorais comuns. Tanto as pastorais como os movimentos, novas comunidades e congregações religiosas precisam se conhecer mutuamente e, juntos, encontrar seu lugar na Pastoral de Conjunto da Igreja local, sempre em comunhão com as orientações específicas do Bispo Diocesano.
183. Não se está propondo uma nova superorganização que promova muitos eventos e atividades, mas a unidade de todas as forças ao redor de algumas metas e prioridades comuns. Os eventos de massa são um exemplo de projetos que podem ser assumidos em comum.
Pistas de ação
184. Organizar o Setor Juventude em cada Igreja Particular, de forma criativa e participativa, para fortalecer e dinamizar a evangelização da juventude a partir de todas as forças presentes.
185. Organizar cursos e oficinas de capacitação técnica para assessores e jovens que tenham responsabilidade pela condução das estruturas organizativas de acompanhamento dos jovens.
186. Garantir que os projetos assumidos em comum não sobrecarreguem as lideranças nem enfraqueçam as diferentes organizações.
187. Investir maiores recursos humanos e financeiros nas estruturas de formação e acompanhamento da evangelização dos jovens.
188. Investir na comunicação através da Internet, como meio eficaz e barato de passar informações e conteúdos e de fortalecer as estruturas de acompanhamento.
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6ª Linha de Ação: MINISTÉRIO DA ASSESSORIA
Desafios e princípios orientadores
189. Desejamos identificar e capacitar assessores adultos, pois não há processo de educação na fé sem acompanhamento, e não há acompanhamento sem acompanhante. Enquanto em nossas dioceses não houver adultos e jovens-adultos que se responsabilizem efetivamente por um consistente trabalho juvenil local, os resultados serão sempre aquém do desejado.
190. Falando para os jovens na Jornada Mundial da Juventude em Colônia, o Papa Bento XVI disse: "Hoje as ovelhas sem pastores são os jovens! Sejam vocês os pastores destas ovelhas". A dificuldade principal para evangelizar esta nova geração de jovens é a falta de assessores adultos. Há dois problemas: o número pequeno de adultos que trabalham com os jovens e a falta de clareza de projeto pastoral e de metodologia para chegar aos jovens e envolvê-los num processo de educação na fé. Chama a atenção a ausência de padres que abraçam um trabalho de acompanhamento sistemático dos jovens. As religiosas/os e leigos/as adultos também estão muito distantes. Há necessidade de resgatar no coração dos padres, religiosos, leigos adultos e da própria Igreja como um todo, a paixão pela juventude. Na falta de adultos, há jovens que se vêem obrigados a serem assessores de jovens. Diferentes estudos têm mostrado o papel insubstituível do adulto, seja religioso ou leigo, no trabalho com jovens.
191. Quando falamos de ministério, falamos de serviço e todo serviço exige vocação. A assessoria dos jovens é um verdadeiro ministério, uma vocação. O assessor é chamado por Deus para cumprir esta missão na Igreja, da qual recebe o envio.
192. Embora protagonista do seu próprio processo de crescimento humano e cristão, o jovem não caminha sozinho. No processo de acompanhamento o assessor é o acompanhante principal que ajuda o jovem a definir o seu projeto de vida, segundo o projeto de Jesus Cristo. Trata-se de uma pessoa que já clareou seu projeto de vida, passou pelo processo de discernimento vocacional e procura integrar fé e vida. Celebra e partilha sua fé e seu trabalho junto com os jovens. É um educador na fé, pelo testemunho de coerência e pela explicitação do anúncio do Senhor Jesus. Ao mesmo tempo, tem consciência de não ser o responsável principal do acompanhamento do amadurecimento na fé dos jovens, porque sabe que se trata, sobretudo, de uma obra do Espírito Santo.
193. Mais que organizar atividades para os jovens, o assessor é alguém que acompanha processos pessoais e grupais de educação na fé em que eles são considerados protagonistas. As atividades, cursos e eventos devem ser integrados num processo que assegure sua continuidade.
194. Para acompanhar uma nova geração de jovens com traços muito diferentes das gerações anteriores, não basta boa vontade. Não basta que o assessor adulto tenha jeito de jovem. Os tempos exigem preparo, planejamento, clareza de metas e estratégia para alcançá-las.
195. A experiência do assessor jovem tem dado muito bom resultado no Brasil e na América Latina. Trata-se de um jovem com mais idade – um jovem adulto – que tem maturidade na fé e uma experiência acumulada de metodologia de trabalho com jovens. Em muitos lugares, hoje, a pastoral funciona graças à presença destes assessores jovens. Em termos ideais, porém, o assessor jovem deve trabalhar em conjunto com o assessor adulto e ser por ele acompanhado. As duas experiências se complementam: a experiência e sabedoria do assessor adulto e o idealismo, a energia, a audácia e o espírito jovem do assessor
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63 JOÃO PAULO II, Fides et ratio, nº. 48
jovem. Há necessidade de estabelecer critérios para escolher o assessor jovem. Não pode ser por autoproclamação como acontece em alguns lugares.
196. Enfim, os diferentes tipos de assessores se complementam. Eles podem ser assessor-padre, assessor-religioso, assessor-leigo adulto, e assessor-jovem, isto é, um jovem-adulto(a), com mais experiência.
Pistas de ação
197. Elaborar estratégias para envolver assessores adultos para acompanhar os processos de educação na fé dos jovens.
198. Investir na formação e na possível liberação de assessores adultos e jovens adultos, em todos os níveis. Nesta tarefa, o Setor Juventude da CNBB e os Institutos e Centros de Pastoral da Juventude prestam um serviço valioso.
199. Definir bem as pessoas responsáveis (assessores, articuladores) pelo trabalho juvenil em todas as instâncias eclesiais: nacional, diocesano, paroquial, comunitário.
200. Organizar comissões de assessores incluindo padres, religiosos(as), leigos adultos, jovens adultos. Estas comissões são espaços de apoio afetivo, troca de experiências, revisão de vida, oração e elaboração de estratégias para melhorar o serviço de acompanhamento.
201. Nomear padres, religiosos e leigos adultos que tenham vocação e paixão pela juventude, assegurando sua permanência na Assessoria por um tempo razoável.
202. Garantir a formação de novos assessores, possibilitando a renovação periódica daqueles que acompanham a evangelização da juventude.
7ª Linha de Ação: DIÁLOGO FÉ E RAZÃO
Desafios e princípios orientadores
203. Na medida em que cresce a escolaridade, em especial na fase universitária, os jovens se fascinam pela racionalidade das ciências e tecnologias, eficiência e organização da sociedade produtiva e do mercado, de tal forma que frequentemente sua fé entra em conflito com a razão. Como conseqüência, às vezes, os jovens abandonam sua fé. A ação pastoral deve favorecer a base intelectual da sua fé para que saibam se mover de maneira critica dentro do mundo intelectual que frequentemente hostiliza a religião e a Igreja institucional. No ambiente da universidade, uma fé emocional ou infantil não resiste aos ventos contrários. Houve um tempo em que "a Fé, privada da razão, pôs em maior evidência o sentimento e a experiência, correndo o risco de deixar de ser uma proposta universal. É ilusório pensar que, tendo pela frente uma razão débil, a fé goze de maior incidência; pelo contrário, cai no grave perigo de ser reduzida a um mito ou superstição. Da mesma maneira, uma razão que não tenha pela frente uma fé adulta não é estimulada a fixar o olhar sobre a novidade e radicalidade do ser"63.
204. Muitos universitários permanecem abertos à dimensão espiritual da vida, porém desligados da Igreja institucional. Os valores da modernidade têm uma atração especial para os jovens universitários: a democracia, o diálogo, a busca da felicidade, a transparência, os direitos individuais, a liberdade, a justiça, a igualdade dos direitos e o respeito pelas diferenças. No meio universitário predominam o discurso e método
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64 Ibid.: nº. 100
65 Ibid.: nº. 16
científico. A ação evangelizadora neste meio precisa acolher tais valores. "A Igreja continua profundamente convencida de que fé e razão se ajudam mutuamente, exercendo, uma em prol da outra, a função tanto de discernimento crítico e purificador, como de estímulo para progredir na investigação e no aprofundamento"64. Portanto, urge evangelizar estes futuros formadores de opinião pública, demonstrando que "a razão e a fé não podem ser separadas sem fazer com que o homem perca a possibilidade de conhecer de modo adequado a si mesmo, o mundo e Deus"65.
205. Os argumentos intelectuais para serem convincentes devem ser acompanhados pelo testemunho de uma vida cristã autêntica. A imagem que a Igreja projeta na sociedade é muito importante para a evangelização de uma juventude cada vez mais escolarizada: uma igreja comprometida com os setores marginalizados da sociedade, que evangeliza a partir do testemunho e dinamismo de seus membros, de maneira especial de jovens que são apóstolos de outros jovens, uma Igreja alegre e acolhedora que ama e acredita nos jovens.
206. Por fim, a Igreja lamenta profundamente a instrumentalização das pesquisas científicas pelo poder econômico, principalmente quando visa à guerra ou à submissão de grandes parcelas da humanidade. Ela considera que o desenvolvimento da ciência e da tecnologia deve ter sempre como eixo fundamental o respeito à vida e à dignidade humana e visar ao bem de toda a humanidade.
Pistas de ação
207. Promover grupos, retiros, vivencia dos sacramentos, cursos, espaços de reflexão e estudo para que os jovens possam ter uma adequada formação e experiência de Deus e, nas palavras de São Paulo, aprender a dar razão da sua fé.
208. Organizar uma eficiente pastoral nas universidades articulada por pessoas devidamente preparadas.
209. Buscar e formar assessores capazes de acompanhar com segurança, mantendo sempre o justo equilíbrio entre fé e razão. Há um número significativo de jovens universitários na Pastoral Universitária, nas Pastorais da Juventude e nos Movimentos Eclesiais que precisam encontrar um espaço e assessoria para aprofundar a relação fé e razão.
210. Despertar o espírito missionário para que os jovens universitários sejam apóstolos dos outros jovens no meio universitário e participem de projetos na sociedade junto aos mais pobres e aprendam a colocar o saber intelectual a serviço da transformação social: pré-vestibulares alternativos e projetos sociais de renda, de saúde, de moradia, de alfabetização.
8ª Linha de Ação: DIREITO À VIDA
Desafios e princípios orientadores
211. Frente à situação de extrema vulnerabilidade a que está submetida a imensa maioria dos jovens brasileiros, é necessária uma firme atuação de todos os segmentos da Igreja no sentido de garantir o direito dos jovens à vida digna e ao pleno desenvolvimento de suas potencialidades. Isso se desdobra e concretiza no direito à educação, ao trabalho e à
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66 Cf. CNBB, doc. 71, Diretrizes… 2003 – 2006, nº 85f
67 JOÃO PAULO II, Centesimus Annus (1991), nº 34.
renda, à cultura e ao lazer, à segurança, à assistência social; à saúde e à participação social.
212. O Documento de Puebla propõe: "Sejam incentivadas ou apoiadas as iniciativas que favoreçam a educação dos jovens, visando à formação de uma personalidade madura e equilibrada, à correta vivência da sexualidade, à vivência do amor verdadeiro, ao autocontrole em face dos desvios do alcoolismo, da dependência de drogas e do consumismo fácil e ilusório"66.
213. A juventude é a etapa da vida em que geralmente se completa a formação física, intelectual, psíquica, social e cultural. É tempo também propício à formação para a cidadania, em que os indivíduos tomam ciência de seus direitos e responsabilidades. Apenas através da efetivação dos direitos básicos é possível esperar que os jovens assumam suas responsabilidades frente à sociedade, tornando-se cidadãos responsáveis pela condução de suas vidas e da nação.
214. As políticas públicas são mecanismos através dos quais os direitos podem ser universalizados e visam a uma reorientação do Estado para uma sociedade justa e solidária por meio de ações duradouras e capazes de reformar as instituições. A elaboração, implantação e execução das políticas públicas necessárias para superar esses desafios são de responsabilidade de Municípios, Estados e União, mas exigem o acompanhamento e o controle democrático por parte de todos os cidadãos. A democracia se exerce não apenas entregando o poder aos homens e mulheres que elegemos, mas pela participação constante e ativa de toda a sociedade na vida política.
215. Um desafio urgente é garantir que todos os jovens tenham acesso aos direitos fundamentais, numa sociedade marcada por profundas desigualdades sociais, regionais, raciais e de gênero. A vulnerabilidade dos jovens na atualidade e a atuação dos movimentos juvenis colocaram na pauta nacional o tema das políticas públicas de juventude. Para que as políticas públicas sejam adequadas às necessidades e anseios dos jovens, é fundamental que eles sejam ouvidos na sua formulação, implantação e avaliação.
216. Tais desafios devem ser enfrentado por todos os segmentos da Igreja. Eles não são responsabilidade apenas dos jovens e das jovens católicas. Neste caso específico, deve ser buscada a colaboração com outras organizações da sociedade civil, movimentos juvenis, ONGs, órgãos governamentais, parlamentos, universidades, outras Igrejas e grupos religiosos.
217. Muitos aspectos desse conjunto de desafios estão intimamente relacionados às estruturas produtoras de desigualdade social que marcam a sociedade brasileira. Muitas ações podem ser desenvolvidas para amenizar a situação em que vivem jovens brasileiros, mas para superá-los é necessário garantir a renda mínima ou tornar o crédito acessível aos pobres. Supõem o crescimento econômico, com justa distribuição de renda. Não cabe aqui discutir aspectos técnicos da questão, mas é nossa responsabilidade reafirmar que: "É estrito dever de justiça fazer que as necessidades humanas fundamentais sejam satisfeitas"67.
218. Falta, para os jovens que exercem uma militância na sociedade, um maior aprofundamento na Doutrina Social da Igreja.
38
68 Para um detalhamento destes campos de ação pode-se consultar anexo 6.
69 Exortação Apostólica«CATECHESI TRADENDAE » 38
Pistas de ação
219. Comprometer os diferentes segmentos da Igreja com a promoção de ações que visem garantir os direitos fundamentais dos jovens, em vista da68: superação das estruturas produtoras de desigualdade social, ampliação do acesso e da permanência na escola de qualidade, erradicação do analfabetismo entre os jovens, preparação para o mundo do trabalho, geração de postos de trabalho e renda, luta para que os direitos trabalhistas dos jovens sejam respeitados, promoção de vida saudável, democratização do acesso ao esporte, ao lazer, à cultura e à tecnologia da informação, promoção dos direitos humanos e das políticas afirmativas, combate à criminalidade e garantia da segurança pública, estímulo à cidadania e à participação social, democratização do acesso à terra e defesa de uma política agrícola que incentive a pequena agricultura familiar, reconhecimento e valorização da qualidade de vida dos jovens no meio rural e nas comunidades tradicionais.
220. Apoiar os jovens que exercem uma militância nas organizações da sociedade, dando-lhes assessoria a partir da Doutrina Social da Igreja e do Magistério.
221. Estimular o debate no interior da Igreja sobre temas que afetam diretamente a vida dos jovens, e que exigem um posicionamento público, como a redução da maioridade penal e o estabelecimento de políticas de cotas nas universidades, para afro-descendentes, indígenas e estudantes oriundos das escolas públicas. Neste debate é preciso considerar seriamente os argumentos de especialistas e dos movimentos juvenis que têm conhecimento técnico e da realidade.
222. Levar o jovem a valorizar e a comprometer-se com a sacralidade e inviolabilidade da própria vida e da dos seus semelhantes.
CONCLUSÃO
223. A juventude é o momento das grandes decisões na vida do ser humano no estudo, na carreira, nos valores a serem seguidos, no projeto de vida, na vocação. "A fase da puberdade e da adolescência [...] é o tempo da descoberta de si mesmo e do próprio mundo interior; o tempo dos planos generosos; o tempo do desabrochar do sentimento do amor, com os impulsos biológicos da sexualidade; o tempo do desejo de estar junto com os outros; o tempo de uma alegria particularmente intensa, ligada à inebriante descoberta da vida. Muitas vezes, porém, é simultaneamente a idade das interrogações mais profundas; das indagações angustiadas ou mesmo frustrantes; de certa desconfiança em relação aos outros, acompanhada do debruçar-se sobre si mesmo, fechando-se; é a idade, por vezes, dos primeiros fracassos e das primeiras amarguras."69 Trata-se da fase da vida humana em que a personalidade pode ser moldada com mais facilidade para o bem ou para o mal. O futuro de qualquer instituição depende de sua capacidade de atrair e envolver os jovens para dar continuidade aos seus objetivos. O desafio de encontrar uma pedagogia para evangelizar os jovens é decisivo para o futuro da Igreja e o crescimento dos próprios jovens.
224. Como pastores, queremos convocar toda a Igreja a investir na evangelização da juventude para que seja dinamizadora do corpo eclesial e social. A fé é um dom de Deus,
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mas, também, requer a nossa participação. A parábola do semeador (Lc 8,5-15) nos faz lembrar da importância de nossa ação junto aos jovens. Se não nos preocuparmos em preparar o terreno, a semente da Palavra poderá cair em terra com pouca profundidade ou pedregosa demais. A nova vida que nasce poderá, também, ser asfixiada por um ambiente pouco propício e repleto de propostas enganosas. O evangelizador do jovem é um semeador que procura conhecer e preparar o terreno, aprende os melhores métodos e a melhor hora para jogar a boa semente. Sabe que, a partir do momento em que as sementes começarem a brotar, ele precisará irrigar, adubar e acompanhar a nova vida que nasce. Esta é a missão que recebemos do Senhor e que queremos partilhar com os jovens e seus agentes de pastoral e com toda a comunidade eclesial.
225. O sucessor de Pedro, Bento XVI, convocou os católicos de América Latina a serem discípulos e missionários de Jesus Cristo no terceiro milênio cristão. Nossa esperança é que as jovens e os jovens do Brasil acolham esta convocação e com Maria, a jovem de Nazaré, anunciem o Cristo ressuscitado como o jovem do Evangelho (Mc 16,6-7): "Não vos assusteis! Procurais Jesus, o nazareno, aquele que foi crucificado? Ele ressuscitou! Ele vai à nossa frente para a Galiléia.
40
70 Este perfil está inspirado num texto de William César Castilho Pereira, Psicólogo, Analista Institucional. Doutor pela UFRJ. Professor PUC Minas, ISTA, ISI. Autor de livros e artigos.
ANEXO 1:
IMPACTO DAS TENDÊNCIAS DO MUNDO CONTEMPORÂNEO
SOBRE OS JOVENS70
226. Diversos estudos do mundo urbano globalizado coincidem ao indicar traços comuns da cultura contemporânea que exercem forte influência sobre a juventude. Alguns destes traços estavam presentes em outras épocas, e alguns estão presentes, também, no meio dos adultos. Falamos de tendências. Eis algumas delas:
• Centralidade das emoções e relativização dos valores e das tradições: escolhas de experiências sem critérios absolutos. Valoriza-se mais o flexível, o momentâneo e anseia-se gozar o momento presente, com poucas perspectivas para o futuro. Tem-se dificuldades com o silêncio interior.
• Uma geração de pouca leitura e da imagem, acostumada a estímulos constantes para manter sua atenção. Uma geração "zapping" (com controle remoto da TV na mão), mudando de canal em canal para encontrar novos estímulos. Ao mesmo tempo, há necessidade de levar em conta que talvez esteja havendo mudança nos modos de ler, por exemplo, através da Internet.
• Não acredita em compromisso definitivo, no mundo do trabalho, nem na vida consagrada, nem na vida conjugal. Tudo isso afasta e amedronta. Muda-se o modo de enfrentar os compromissos. Há grande dificuldade e medo em se escolher uma faculdade, uma profissão. ... em definir um projeto de vida.
• Opção por relações interpessoais e horizontais. Preferência por relações democráticas, de tolerância horizontal e aberta. Os grupos de amigos e "a boa relação familiar" são muito valorizados. Há rebeldia diante de instituições "retrógradas" e impaciência com autoridades despóticas. Percebe-se também o sentimento de pertença nas motivações e experiências horizontais e democráticas, menos segregação racial e preconceituosos.
• Fragmentação da identidade: Há grande confusão quanto à imagem de si mesmo e fuga de relações estáveis.
• Maior entrosamento entre os gêneros masculino e feminino: homens que vivenciam harmoniosamente traços da feminilidade; mulheres que entram no mercado da força de trabalho em crescente igualdade de condições.
• Enfoque da subjetividade. A pessoa está centrado quase unicamente nos seus problemas e necessidades pessoais.
• Desinteresse pela macro-política e grandes estruturas: maior inclinação pelas pequenas transformações do que de grandes obras ou revoluções.
• Tendência ao sincretismo religioso e às formas religiosas ecumênicas: maior liberdade de expressão e dificuldades em viver vinculado a valores institucionais, a uma estrutura de paróquia e à figura da autoridade.
• Tendência ao hedonismo e à vulnerabilidade psicológica: dificuldade de elaboração de momentos de frustração, do tempo de espera, das angústias, e opção preferencial pelo prazer e pela felicidade, entretenimento e consumo
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71 Os dados não abrangem a área rural da Região Norte, exceto o Estado de Tocantins.
imediato. Não questiona a sociedade de consumo. Frente aos desafios e obstáculos que a vida, às vezes, apresenta, o jovem se sente tentado a desistir. Busca-se imperativamente a felicidade. Ao mesmo tempo, frente à ameaça da fragmentação, há um segmento da juventude que revela tendência de refugiar-se no conservadorismo ou até num certo fundamentalismo.
227. Este perfil da juventude contemporânea pode parecer muito negativo. Porém, não estamos falando de toda a juventude. Há jovens que são diferentes do retrato descrito. Estamos falando das grandes tendências. Tampouco, não podemos cair na tentação de nostalgia, considerando que as gerações anteriores eram melhores. Cada geração tem suas luzes e sombras. Esta geração não é pior ou melhor que as outras gerações. Devemos evitar uma supervalorização da juventude de outras épocas. E o processo de evangelização, a metodologia, os enfoques, o ponto de partida e o sistema de acompanhamento têm que levar isso em conta para não ficar encalhado na estrada de uma história que não espera. A juventude de hoje é tão idealista e generosa quanto a anterior. Basta saber trabalhar com ela. A questão é a metodologia de trabalho e a paciência para acompanhar os processos de educação na fé. O processo, hoje, leva mais tempo e exige um investimento maior para penetrar as barreiras do individualismo e da indiferença.
ANEXO 2:
SITUAÇÃO SOCIOECONÔMICA DA JUVENTUDE BRASILEIRA
228. As disparidades de renda são grandes entre os jovens. Em 2000 (Censo IBGE): a maioria (68,7%) vivia em famílias que tinham uma renda per capita menor do que 01 salário mínimo (dentre esses encontramos 12,2% (4,2 milhões) em famílias com renda per capita de até ¼ do salário mínimo). Apenas 41,3% (14,1 milhões) viviam em famílias com renda per capita acima de um salário mínimo.
229. Considerando esse perfil de renda e, também, outros indicadores de desigualdade social, evidenciam-se alguns dos principais problemas com os quais se deparam, hoje, os jovens brasileiros, no que diz respeito à educação, trabalho, cultura e lazer, gravidez na adolescência e violência.
230. Em relação à escolaridade, as estatísticas relativas a esse segmento social, são alarmantes. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD, em 200371, havia no Brasil 23,4 milhões de jovens de 18 a 24 anos, o que representava, aproximadamente, 13,5% da população total e apenas 7,9 milhões (34%) estavam freqüentando a escola. Portanto, 15,4 milhões de jovens de 18 a 24 anos estavam fora da escola. Desses:
• 753,4 mil (4,9%) eram analfabetos;
• 5,4 milhões (35,3%) não haviam concluído o Ensino Fundamental;
• 1,7 milhão (11%) haviam concluído o Ensino Fundamental;
• 1,2 milhão (7,8%) haviam começado o Ensino Médio, mas não o haviam concluído;
42
72 Secretaria Geral da Presidência da República, Coordenação Nacional do PROJOVEM, março 2005, Regina Novaes.
• 5,8 milhões (37,5%) haviam concluído o Ensino Médio;
• 547 mil (3,5%) haviam cursado pelo menos um ano de Ensino Superior.
231. No entanto, precocemente afastados da escola, estes jovens também não estavam inseridos no mercado de trabalho formal. Dentre esses jovens, 14 milhões (60%) desenvolviam algum tipo de ocupação, sendo que 13% ou 3,0 milhões de jovens declararam-se como desempregados (55% eram mulheres). As maiores taxas de desemprego encontravam-se nas regiões metropolitanas: 24,6%. Nas áreas urbanas a percentagem chegava a 17,6%72.
232. Segundo dados do Censo de 2000, 84% dos jovens brasileiros viviam no meio urbano, sendo que 31% em regiões metropolitanas, onde se evidencia um acelerado crescimento sem sustentabilidade sócio-ambiental, a expansão das favelas e de periferias caracterizadas pela ausência de infra-estrutura e equipamentos urbanos e de segurança pública, o que evidencia outra faceta da situação de vulnerabilidade em que se encontram os jovens brasileiros.
233. Como resultado, a maioria dos jovens em nosso país, como em outros da América Latina, vê unicamente, como perspectiva, o desemprego ou a inserção precária no mercado de trabalho, e os salários baixos. Segundo o IBGE, 49% do total de desempregados do país em 2001 estavam na faixa entre 15 e 24 anos. O desemprego é, talvez, o maior problema estrutural de nossa época, já que é resultante de opções de políticas econômicas adotadas na maioria dos países ocidentais. Nada pode pagar o prejuízo feito por esta situação à dignidade pessoal e à auto-estima. Sem perspectivas animadoras, uma parcela dos jovens - sobretudo das classes populares – recorre a outras saídas como a violência, a dependência de drogas, o crime, o suicídio, a migração para o exterior.
234. A violência das grandes cidades atinge particularmente os jovens. Segundo os dados do Ministério da Saúde (Sistema de Informações sobre Mortalidade - Datasus), em 2002, morreram no Brasil 28 mil jovens de 20 a 24 anos, sendo que 72% destas mortes foram ocasionadas por causas externas. Os jovens do sexo masculino foram o alvo prioritário dessas perdas: 18,5 mil mortes, o que corresponde a 80,5% do total.
235. Publicação divulgada recentemente pela UNESCO mostra que, em 2002, a taxa de homicídios na população jovem foi de 54,5 para cada 100 mil habitantes, contra 21,7 para o restante da população. Dados do Mapa da Violência III, da UNESCO (2002), indicavam que essa taxa, para o grupo de jovens de 15 a 24 anos no Brasil (45,8 por 100 mil jovens, em 1999), era a terceira maior do mundo, ficando atrás apenas da Colômbia e de Porto Rico e sendo quase oito vezes maior que a da Argentina (6,4 por 100 mil jovens em 1998).
236. Parte deste quadro de violência está relacionado ao tráfico de drogas que vitima os jovens que estão na ponta da distribuição, mas raramente atinge os segmentos que financiam a produção e lucram com este negócio transnacional. No entanto, as pesquisas recentes sobre o uso de drogas apontam que o maior problema está no consumo de álcool: segundo a pesquisa do Projeto Juventude 52% dos jovens disse que costumam ingerir bebida alcoólica, 13% fumam, enquanto que 10% declararam que já experimentaram maconha e 3%, cocaína.
237. Existem jovens em condições também precárias vivendo nas pequenas e médias cidades e no campo. No meio rural vive uma parcela significativa da juventude brasileira (16%),
43
73 Instituto da Cidadania. Projeto Juventude. Documento de Conclusão. São Paulo, 2004, p.12.
74 Instituto da Cidadania. Projeto Juventude. Documento de Conclusão. São Paulo, 2004, p. 69.
o que equivale a cerca de 5,5 milhões de jovens, que sofrem graves situações de exclusão: o analfabetismo atinge 3,8% da população juvenil (pouco mais de um milhão de pessoas) e, destes, quase metade (43%) vivem em áreas rurais73. As situações de violência relacionadas ao narcotráfico e à prostituição infanto-juvenil são fenômenos que passam a atingir também os jovens das pequenas cidades e do meio rural.
238. As dificuldades enfrentadas pelos jovens do meio rural se assentam, em primeiro lugar, na falta de um modelo agrícola voltado para a agricultura familiar. O modelo econômico vigente tem deixado o pequeno agricultor cada dia mais vulnerável. A diminuição da renda faz com que grande parte da população camponesa, em especial os jovens, abandonem a área rural. A juventude rural sofre, ainda, com possibilidades mínimas na área da educação e da ocupação produtiva, carecendo também de alternativas básicas em equipamentos de lazer, cultura e saúde74.
239. Outra situação que vem afetando os jovens é a gravidez na adolescência. Segundo dados de 2001, dos 3,2 milhões nascidos vivos, 695 mil (22,6%) eram de mães entre 15 e 19 anos. Entre 1980 e 2000 houve crescimento de 15% no índice de gravidez de jovens de 15 a 19 anos de idade.
240. A dívida pública (interna e externa), a corrupção e a impunidade desviam recursos financeiros necessários para melhorar a qualidade da educação, da saúde, da moradia, e para gerar empregos. Os jovens são as maiores vítimas da má qualidade da educação, da saúde e da habitação.
241. Em resumo, os dados sobre a situação socioeconômica expressam o quadro das desigualdades sociais entre os jovens brasileiros, indicando a urgência de programas específicos para essa população, no contexto de políticas públicas focadas no segmento juvenil.
ANEXO 3:
VALOR DA EXPERIÊNCIA ACUMULADA PELA IGREJA
Década de 60: Ação Católica Especializada
242. O que marcava a atuação com a juventude antes dos anos 60 era a presença de diversos movimentos eclesiais que trabalhavam na dimensão devocional – como as Congregações Marianas, Filhas de Maria, Cruzada Eucarística e outros grupos que promoviam diversas atividades que atingiam a juventude. Trata-se de experiências valiosas que não pretendemos estudar aqui devido à nossa limitação de espaço. Portanto, inicia-se este resgate histórico a partir do período em torno do Concílio Vaticano II. Nas décadas de 50 e 60, do século XX, há transformações profundas acontecendo na sociedade: crescimento econômico, industrialização, urbanização, revoluções políticas e mudanças no comportamento. No Brasil, o movimento popular no campo e nas cidades e o movimento dos estudantes estão crescendo, pressionando para a efetivação de reformas de base e da reforma agrária. É nessa época que Paulo VI escreve sua encíclica Populorum Progressio e nela mostra a visão cristã do desenvolvimento e aponta pistas
44
75 Juventude Operária Católica (JOC), Juventude Universitária Católica (JUC), Juventude Estudantil Católica (JEC), Juventude Agrária Católica (JAC), Juventude Independente Católica (JIC)
76 Conclusões de Medellin – II Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano", 5,1.
para um desenvolvimento solidário da humanidade. Em 1965 termina o Concilio Vaticano II.
243. Já no final do século XIX, o Papa Leão XIII, na encíclica Rerum Novarum, convocava a todos a se unirem para realizar uma ordem social justa. Logo depois, na década de 30, Pio XI havia convocado os fiéis a se organizarem para enfrentarem os desafios que a situação mundial colocava para a Igreja. Surgiu, em muitas partes do mundo, também no Brasil, a Ação Católica Geral. Numa segunda fase, a Ação Católica Especializada foi muito incentivada pelos Papas Pio XI e Pio XII. O fundador da Ação Católica Especializada, o Cardeal Cardjin percebe que, com a revolução industrial, a sociedade havia mudado radicalmente. A nova cultura não considera mais a religião como o centro de tudo. Vários grupos passam a hostilizar a religião como "ópio do povo" e como anti-intelectual e há setores onde a Igreja não tem mais acesso, de modo especial, o operariado. É necessário mudar de estratégia pastoral. A Igreja precisa sair da sacristia e ir ao encontro desse povo nos lugares onde ele se encontra. A solução era o envolvimento do laicato na missão de evangelização. Trata-se de uma grande reserva que poderia ser mobilizada. A tarefa de evangelizar os jovens operários, camponeses e estudantes seria feita por outros jovens, dentro do seu ambiente. Esta nova visão recebe forte apoio do Concílio Vaticano.
244. A Ação Católica Especializada desenvolveu uma nova metodologia para enfrentar os desafios de uma sociedade em transformação. Havia necessidade de partir da vida dos jovens. Surge o método Ver-Julgar-Agir que continua sendo um importante instrumento na ação pastoral da Igreja hoje. Os pequenos grupos e a organização dos grupos em rede se tornam uma estratégia importante de envolvimento e formação dos jovens. É forjada uma espiritualidade que desperta os jovens para o engajamento na comunidade eclesial e na sociedade. Neste processo surge um novo tipo de agente evangelizador adulto que respeita e promove o protagonismo dos jovens, nos diferentes ramos da Ação Católica Especializada, JOC, JUC, JEC, JAC75.
245. A nova proposta iria revolucionar a pedagogia dentro da Igreja, de modo especial na América Latina. Essa metodologia fez surgir uma nova espiritualidade, unindo fé e vida. Com o tempo, essa metodologia foi assimilada por setores mais amplos da Igreja que passaram a analisar os problemas sociais a partir da ótica dos empobrecidos e apoiar suas lutas de transformação social.
246. A Ação Católica Especializada exerceu grande influência sobre o desenvolvimento da Igreja do Brasil e da América Latina. Em Medellín os bispos tomam consciência de um fenômeno novo. Descrevem a juventude como "novo corpo social", "grande força de pressão", com seus "próprios ideais, valores e dinamismo interno"76. A Ação Católica foi um dos mais importantes movimentos da Igreja, nos últimos tempos, pois trouxe novas idéias, novas intuições e novos horizontes para a evangelização.
Década de 70: Movimentos de Encontros para Jovens
247. Efetuou-se, então, uma mudança profunda da sociedade brasileira. O governo militar se radicaliza. A repressão e a censura não aceitam a discordância e a contestação. Surge outra maneira de trabalhar com a juventude, mais adaptada a esta nova realidade, principalmente política: os Movimentos de Encontros para Jovens.
45
248. Os Movimentos de Encontro reuniam jovens para encontros de fim de semana, usando uma metodologia que se inspirava no Cursilho de Cristandade. Os encontros eram coordenados por adultos e alguns jovens que participavam com tarefas secundárias. Nas palestras dava-se importância ao testemunho pessoal dos próprios palestristas, evitando-se palestras muito intelectualizadas. O testemunho pessoal comovia mais. Lançava-se mão de cantos com leveza melodiosa com sentido evangelizador. Os dirigentes procuravam criar forte impacto emocional: mensagens de parentes e amigos, depoimentos nas palestras, acolhida, amizade e atenção individual mostradas pelos dirigentes, liturgias participativas, oração espontânea, e música animada. Na base dos encontros houve uma experiência forte, emocional, de encontro com Deus e de conversão. Os Movimentos buscavam soluções para os problemas pessoais dos jovens.
249. Num primeiro momento essa nova forma de evangelização teve êxito considerável. Depois começaram a aparecer dificuldades. Depois do encontro não havia proposta viável de continuidade. Havia sim: engajamento no próprio movimento. Os jovens iam trabalhar nos encontros seguintes. As propostas de pós-encontro funcionavam durante algum tempo, encontrando dificuldades para manter a chama acesa a longo prazo. Foi-se percebendo, também, os limites de uma metodologia de impacto emocional que deixava a impressão de que a fé dependia dos sentimentos. Desaparecendo a emoção, em muitos casos, desaparecia também a fé.
250. Os movimentos de encontros de jovens tiveram o mérito de apresentar e vivenciar um modelo de Igreja mais atraente para os jovens: igreja-comunidade, alegria, celebrações animadas e criativas. Aproximou os jovens dos padres. Havia uma consciência de que "a Igreja somos nós". Os movimentos de encontro provocaram o surgimento de muitos grupos de jovens nas paróquias, ofereceram também muitas vocações para o ministério sacerdotal e para a vida consagrada e foram um dos fatores que contribuíram para o surgimento, a seguir, de uma nova maneira de trabalhar com os jovens: a Pastoral da Juventude Orgânica.
Década de 80: Pastoral Orgânica da Juventude
251. No final dos anos 70 e durante os anos 80 a sociedade brasileira passou, novamente, por profundas mudanças, com as manifestações da sociedade civil, exigindo a volta da democracia, que acabaram influindo na maneira de conduzir a ação evangelizadora juntos aos jovens.
252. Os diferentes setores da sociedade civil começaram a se organizar para exigir a volta do estado de direito: estudantes, intelectuais, advogados, professores, operários. Os jovens voltaram às ruas. As bandeiras eram direitos humanos, anistia para os exilados, liberdades democráticas, "diretas já!".
253. Politicamente uma grande parte da juventude havia mudado de progressista para conservadora durante a primeira parte da década de 70, preocupando-se principalmente com seus problemas pessoais. Agora aparece outra geração. A partir da segunda metade dos anos 70 e com mais força nos anos 80, o enfoque é a centralidade das utopias, começando com a conquista da democracia. As lideranças são muito influenciadas pela cultura moderna e a importância dada à razão, às teorias e às ideologias. São líderes que estudam e lêem muito e que gostam dos debates e do confronto das idéias.
254. Há necessidade de adequar a evangelização para acolher os novos valores da liberdade, da participação política e da consciência crítica. Surge uma nova geração de jovens
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77 A evangelização juvenil procurava realizar o que a Conferência de Puebla havia proposto na opção preferencial pelos jovens: uma pastoral juvenil orgânica e diferenciada.
78 Tenha-se presente a opção preferencial pelos jovens e as "diretrizes" lançadas pelos bispos em Puebla.
católicos que são protagonistas do seu próprio processo de educação na fé e que possa dialogar com a nova realidade que surgia77.
255. Verifica-se o surgimento de muitos grupos de jovens nas paróquias, mas estes grupos estavam isolados, sem projeto pastoral e sem objetivos claros. Para tirá-los da superficialidade das suas reuniões sem preparação e da rotatividade dos seus membros foi estabelecida uma rede desses grupos que pudesse facilitar o encontro com outros jovens, acumular e sistematizar as experiências, clarear o projeto pastoral e desencadear processos grupais de educação na fé através de um planejamento participativo.
256. A ação evangelizadora da juventude passou a ser planejada e avaliada pelos próprios jovens e seus assessores, nos diferentes níveis da Igreja: diocesano, regional e nacional. Assim nasce a Pastoral da Juventude Orgânica78. A Pastoral da Juventude se organiza, num primeiro momento, em âmbito de dioceses e depois em alguns regionais. Um grande passo se deu em 1983 quando, por convocação do Setor Juventude da CNBB, se realizou um Encontro Nacional com delegados vindos de todos os Regionais da CNBB, sendo a maioria dos delegados jovens. Estavam presentes, também, bispos e sacerdotes. O Encontro Nacional desencadeou um novo processo.
257. Os anos seguintes são anos de crescimento rápido das articulações, de fortalecimento da estrutura de organização em todos os níveis, de clarear o projeto de pastoral, de grande elaboração teórica (documentos, cadernos de estudo, subsídios), de formação de um corpo dinâmico de assessores, de fortalecimento e crescimento de Centros e Institutos de Juventude em diferentes pontos do país. Além da Pastoral da Juventude (PJ) que articula os grupos paroquiais, se organizam, em nível nacional, outras pastorais específicas: Pastoral da Juventude Estudantil (PJE), Pastoral da Juventude Rural (PJR), Pastoral da Juventude do Meio Popular (PJMP).
258. O novo modelo de organização se firmou rapidamente, a partir de assembléias diocesanas e nacionais. Iniciou-se a experiência de uma pastoral coordenada pelos próprios jovens e assessorada por adultos.
259. Em 1984 houve um encontro latino-americano de responsáveis nacionais de Pastoral da Juventude, convocado pelo Setor Juventude do CELAM (Conselho Episcopal Latino Americano). Nos anos seguintes, organizaram-se encontros anuais com a participação de quase todos os países (22 países) para clarear o projeto pastoral. Este projeto pastoral integra muitos elementos da Ação Católica Especializada (método Ver-Julgar-Agir, pequenos grupos, rede de grupos, Dia Nacional da Juventude, modelo de assessor, opção pelos pobres e pela transformação social, protagonismo dos jovens). Há novos desafios a serem enfrentados: o vanguardismo de alguns, a tentação de instrumentalizar a fé, a dificuldade de respeitar as etapas de crescimento na fé e a necessidade de uma formação que fosse integral. A nova metodologia forma uma geração de líderes que, até hoje, continuam engajados: jovens que se engajaram na sua Comunidade Eclesial de Base, nas pastorais da Igreja, nos movimentos populares, no movimento estudantil, nos sindicatos, nos partidos políticos e outros que assumiram uma vocação de especial consagração, entrando nos seminários e nas congregações religiosas.
260. O Setor Juventude da CNBB convoca um encontro entre representantes das Pastorais da Juventude e alguns Movimentos (Renovação Carismática, Movimento Focolares e Movimento Comunhão e Libertação) para elaborar um caderno de estudos explicando o carisma e metodologia de cada um e propondo algumas linhas de atuação em comum.
47
79 Santo Domingo, 114
Conclui que há vocações e carismas diferentes e há necessidade de somar forças para evangelizar a juventude. Na prática há dificuldades para encontrar pistas concretas para viabilizar essa proposta.
261. Na década de 80, a Igreja aposta na juventude. O Ano Internacional da Juventude, promovido pela ONU, em 1985, ressaltou a importância da juventude. Em 1979, em Puebla, o episcopado da América Latina escolheu dois grupos para dinamizar a Igreja e a sociedade: os pobres e os jovens. A juventude é uma prioridade na ação pastoral da CNBB e em muitas dioceses. O Papa João Paulo II dá importância à juventude em todas as suas viagens. As Jornadas Mundiais da Juventude convocadas pelo Papa João Paulo II são momentos importantes para criar visibilidade e motivação para acompanhar os processos de educação na fé.
Década de 90 e Novo Milênio
262. Na década de 90 acontecem mudanças que abalam o mundo. Em novembro de 1989, cai o muro de Berlim, símbolo da queda do Socialismo Real. O modelo de Capitalismo Neoliberal, com suas propostas de privatização das empresas estatais e o afastamento do Estado do jogo do livre mercado, apresentou-se como vencedor. Paralelamente há uma mudança cultural. A pós-modernidade se fortalece e acentua a centralidade das emoções e a subjetividade. Aparece uma nova geração de jovens muito distante das identidades dos anos 60 e 80.
263. A evangelização da juventude passa a trabalhar no contexto de uma cultura voltada para a subjetividade e os sentimentos. Há um enfraquecimento das Pastorais da Juventude em muitos lugares. Há uma crise de assessoria adulta, de grupos de base e da estrutura de organização que acompanha os grupos. Não há investimentos da Igreja na evangelização da juventude, como nos anos 80, apesar do documento de Santo Domingo ter reafirmado a opção preferencial pelos jovens de Puebla, não só de modo afetivo, mas efetivamente.79 Há uma carência de assessores adultos e, em muitos lugares, jovens sem experiência são obrigados a assessorar outros jovens. Há uma crescente adolescentização dos grupos de jovens que tem implicações metodológicas importantes.
264. Outra característica da evangelização da juventude na década de 90 é o crescimento dos movimentos eclesiais que trabalham com jovens (Renovação Carismática Católica, Focolares, Movimento de Comunhão e Libertação, Movimentos de Encontros, "Novas Comunidades" como Canção Nova, Shalom e outras). Alguns desses movimentos eclesiais e novas comunidades marcam uma presença forte nos meios de comunicação social, programas de rádio e TV voltados aos jovens, utilização da Internet como meio de evangelização, promoção de acampamentos e missões rurais.
265. Para iniciar um trabalho em conjunto, o Setor Juventude da CNBB organiza um encontro anual das Pastorais da Juventude, Movimentos e Congregações religiosas para aprofundar diferentes temas relacionados com a evangelização dos jovens. Falta envolver mais os movimentos nessa articulação e na escolha e encaminhamento dos temas. Surge, em algumas dioceses, o questionamento sobre a necessidade de formar uma coordenação mais ampla (Setor Juventude) que procura canalizar e somar todas as forças vivas (Pastorais da Juventude, Movimentos Apostólicos, Pastoral de Crisma, Pastoral de Catequese, Pastoral das Escolas Católicas, Congregações Religiosas cujo carisma é a juventude), que trabalham com jovens, sonhando com um trabalho orgânico e diferenciado.
48
80 "Civilização do Amor: Tarefa e Esperança. Orientações para a Pastoral da Juventude Latino-Americana". São Paulo: Paulinas, 1997.
81 "Pastoral da Juventude no Brasil, Estudos da CNBB", No 44. São Paulo: Paulinas, 1986.
82 "Marco Referencial da Pastoral da Juventude do Brasil", Estudos da CNBB, No 76. São Paulo: Paulinas, 1998.
83 Porto Alegre (Instituto de Pastoral da Juventude), São Paulo (Centro de Capacitação da Juventude – CCJ, Centro de Pastoral de Juventude Anchietanum e Centro Pastoral Santa Fé), Goiânia (Casa da Juventude Pe. Burnier – CAJU), Montes Claros (Centro Marista de Pastoral), Belo Horizonte (Instituto de Pastoral de Juventude – IPJ Leste II), São Luís de Maranhão (Instituto de Formação Juvenil) e Manaus (Aiaká). Chamada de Rede Brasileira de Institutos de Juventude.
266. Não podemos deixar de mencionar os trabalhos desenvolvidos para a evangelização da juventude feitos pelas escolas católicas e a importante assessoria feita pela Associação de Educadores Católicos (AEC). Há diversas experiências de trabalho pastoral sério executado por Congregações Religiosas que promovem todo um processo de evangelização que leva em conta o primeiro anúncio, a preparação para os sacramentos, a organização de estágios sociais, trabalhos de voluntariado e formação humana. Este trabalho é acompanhado pela Pastoral da Educação.
267. Entre várias publicações, destacamos o documento, "Civilização do Amor: Tarefa e Esperança", lançado pelo Setor Juventude do CELAM80. É o resultado visível de um processo de educação na fé, assumido e avaliado em conjunto. No Brasil, surgiram os documentos "Pastoral da Juventude no Brasil" (Estudos da CNBB nº. 4481), de 1986, e "Marco Referencial da Pastoral da Juventude do Brasil" (Estudos da CNBB "nº. 76, 1998)82, e o Texto-Base da Campanha da Fraternidade 1992.
268. A Igreja do Brasil conta com o apoio de 11 Centros e Institutos de Juventude83 (Rede Brasileira de Institutos de Juventude) – muitos deles apoiados por Congregações Religiosas - que estão articulados em rede nacional e continental e que oferecem apoio estável e especializado para a tarefa de evangelização dos jovens, com cursos a médio e longo prazo, subsídios, equipes volantes. Há mais de 40 documentos, cadernos de estudo e subsídios de formação elaborados pelos diferentes Centros e pelo Setor Juventude da CNBB e do CELAM. Todos os anos são publicados outros para responder a diferentes necessidades da juventude. Os Centros têm enfoques e especializações diferentes numa linha de espiritualidade, capacitação técnica, cidadania, bíblica, cursos de longa duração. Foi através desses Centros, inclusive, que se levou para dentro da Universidade, um Curso de Pós-Graduação sobre Juventude.
269. De novo, as mudanças na sociedade apresentam um desafio para a evangelização da juventude. Mas, há uma experiência acumulada que precisa ser adaptada à nova realidade. Há elementos da metodologia que precisam ser mudados, integrando novos elementos, novos enfoques e novo ponto de partida para conectar a proposta evangelizadora com a vida dos jovens. Nesta tarefa de elaborar um novo instrumento teórico para evangelizar a juventude, não estamos apenas iniciando. Há um bom caminho andado e há experiências bem sucedidas em diferentes lugares do país.
49
84 "Conclusões de Medellin – II Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano", Publicação do Regional Sul 3 da CNBB, 1968. Referimo-nos ao capítulo sobre Juventude, p. 32-37.
ANEXO 4:
ALGUNS PRONUNCIAMENTOS DO MAGISTÉRIO SOBRE A JUVENTUDE
Conferência Geral de Medellín
270. Em 1968, a Conferência Episcopal de Medellín referia-se à juventude como "uma grande força nova de pressão" e como "um novo organismo social com valores próprios"84.
271. A juventude vive uma época de crises, onde uns aceitam "as formas burguesas da sociedade" e outros as rejeitam. Ela quer transformações profundas, que garantam uma sociedade justa. Os jovens são mais sensíveis aos valores novos do que os adultos. Identificam a Igreja com os padres e bispos, não se identificando com ela porque não se sentem convidados a participar. Qualidades dos jovens, citadas pela Conferência de Medellín, são a autenticidade, a sinceridade e a aceitação do diferente.
272. A Igreja vê na juventude a constante renovação da vida da humanidade. A juventude é o símbolo da Igreja, chamada a uma constante renovação de si mesma. Por isso ela quer desenvolver, dentro da pastoral de conjunto, uma autêntica pastoral de juventude, educando os jovens a partir de sua vida, permitindo-lhes plena participação na comunidade eclesial.
273. Recomendam as conclusões de Medellín: a) que se apresente com mais nitidez a face de uma Igreja autenticamente pobre, missionária, pascal, audazmente comprometida na libertação do homem todo e de todos os homens; b) que a pregação e os documentos pastorais sejam simples e atualizados; c) que o sentido de autoridade se expresse em caráter de serviço; d) que haja uma autêntica orientação vocacional, levando em conta os diferentes estados de vida.
Conferência Geral de Puebla
274. Na quarta parte das Conclusões de Puebla, em 1979, tratando da Igreja missionária a serviço da evangelização na América Latina, o episcopado faz duas opções que marcaram a Conferência: a opção preferencial pelos pobres (32 citações) e pelos jovens (40 citações).
275. O documento fala que a juventude é, também, uma atitude frente à vida numa etapa transitória. Os traços característicos dos jovens são o espírito de aventura, a capacidade criadora, o desejo de liberdade e o fato de serem sinal de alegria e felicidade, exigindo autenticidade e simplicidade. O papel da juventude, no corpo social, é de dinamizar este corpo.
276. A Igreja confia nos jovens, sendo eles a sua esperança. Por ser dinamizadora do corpo social e especialmente do corpo eclesial, a Igreja faz uma opção preferencial pelos jovens com vistas à sua missão evangelizadora no Continente.
277. Por isso o episcopado pede que se desenvolva uma Pastoral de Juventude que:
• leve em conta a realidade social dos jovens;
• atenda ao aprofundamento e crescimento da fé para a comunhão com Deus e os homens;
50
• oriente a opção vocacional dos jovens;
• ofereça elementos para se converterem em fatores de transformação;
• proporcione canais eficazes de participação ativa na Igreja e na sociedade para os jovens.
278. A inserção na Igreja é muito exigente e, por isso, uma Pastoral da Juventude que:
a) seja um verdadeiro processo de educação na fé, cujo fundamento deve ser Jesus Cristo;
b) empenhe-se para que o jovem cresça numa espiritualidade autêntica e apostólica;
c) forme os jovens para a ação sócio-política e para as mudanças de estruturas formando neles o senso crítico através de uma pedagogia que tenha presente as diferenças psicológicas;
d) estimule a capacidade criadora dos jovens, facilitando-lhes os meios em que ponham em prática o seu compromisso;
e) ofereça uma boa orientação espiritual aos jovens a fim de amadurecerem a sua opção vocacional, através de retiros, encontros, cursilhos, convivências. Tempo forte é a celebração consciente e ativa do sacramento da confirmação;
f) forme com prioridade animadores juvenis qualificados, guias e amigos da juventude, encarando a Pastoral da Juventude como uma pastoral da alegria e da esperança.
Conferência Geral de Santo Domingo
279. Em 1992, em Santo Domingo, os bispos da América Latina reafirmam a opção preferencial pelos jovens feita em Puebla, não só de modo afetivo mas efetivamente por uma Pastoral da Juventude Orgânica, com acompanhamento, com apoio real, com diálogo, com maiores recursos pessoais e materiais e com dimensão vocacional. A ação pastoral deve:
a) responder às necessidades de amadurecimento afetivo e à necessidade de acompanhamento;
b) capacitar para que os evangelizados conheçam e respondam criticamente aos impactos culturais e sociais;
c) dinamizar uma espiritualidade do seguimento de Jesus, propiciando o encontro de fé e vida, a promoção da justiça e a geração de uma nova cultura da vida;
d) assumir as novas formas celebrativas da fé, próprias da cultura dos jovens;
e) anunciar que o Deus da vida ama os jovens;
f) abrir espaços de participação na Igreja aos jovens e adolescentes através de uma pedagogia da experiência, promovendo o protagonismo através do método ver-julgar-agir-revisar-celebrar.
ANEXO 5:
GRÁFICO FORMAÇÃO INTEGRAL
O seguinte gráfico pode ajudar-nos a visualizar esta proposta da formação integral: Relação COMIGO MESMO Dimensão Psico-afetiva – Processo de personalização (Quem sou eu?) COM DEUS Dimensão Mística Processo teológico-espiritual (Qual o sentido da minha vida?) COM A SOCIEDADE Dimensão Política Processo de participação –conscientização (Qual é a minha relação com a sociedade?) COM OS OUTROS Dimensão Psicossocial Processo de socialização (Quem é o outro?) COM A AÇÃO Dimensão Técnica Processo de capacitação-metodologia (Habilidades de liderança e como ser agente de mudança?)
51 52
85 Cf. CNBB, doc. 61, Diretrizes… 1999-2002, n. 199.
ANEXO 6:
ASSEGURAR AOS JOVENS O DIREITO À VIDA
280. É necessário comprometer os diferentes segmentos da Igreja com a realização do debate público e com a promoção de ações que visem garantir os direitos fundamentais dos jovens nos seguintes campos:
281. Na Educação - promover e apoiar ações com vistas:
• à ampliação do acesso e a permanência dos jovens na escola de qualidade;
• à promoção de formação profissional;
• à qualificação contínua dos professores;
• à universalização do Ensino Fundamental e Médio para todos os jovens;
• ao enfrentamento do analfabetismo, que atinge mais profundamente os jovens nordestinos, os moradores das áreas rurais e os afro-descendentes;
• ao apoio a propostas de investimento na melhoria dos espaços das escolas públicas, das instalações e equipamentos;
• à integração entre a escola e as culturas juvenis, tornando a escola um espaço em que os jovens se sintam bem e possam desenvolver suas capacidades;
• ao apoio aos programas que concedem bolsas para que os jovens permaneçam na escola;
• ao apoio às experiências de pré-vestibulares alternativos que possibilitem o ingresso de jovens afro-descendentes e pobres nas universidades;
• ao apoio à implantação de política de cotas nas universidades públicas para estudantes oriundos da escola pública e afro-descendentes;
• à implantação e ampliação da concessão de bolsas de estudos nos colégios e universidades católicas para esses jovens;
• ao acesso às tecnologias de informação, promovendo a inclusão digital, em especial dos jovens afro-descendentes e pobres.
• a um consistente projeto de "Educação ao Amor" (amizade, namoro, casamento), que possa oferecer aos jovens católicos verdadeiros valores para a sua formação na área da afetividade e sexualidade, segundo os princípios cristãos
282. No trabalho e renda - apoiar ações que tenham como objetivo a inserção dos jovens no mercado de trabalho através:
• da adoção de uma política econômica voltada para a criação de novos postos de trabalho;
• da implementação de programas que possibilitem o acesso de jovens sem experiência profissional ao mercado laboral;
• do apoio à organização, inclusive com concessão de crédito, de empreendimentos solidários de jovens para que tenham acesso a trabalho e renda, exprimindo a edificação de novas formas de solidariedade85;
• do apoio e contribuição em programas de formação profissional que estejam em sintonia com as novas conformações do mercado de trabalho;
• da ampliação das oportunidades de estágios remunerados para jovens;
• da garantia aos jovens do meio rural do acesso à terra.
283. Na Cultura e lazer - apoiar ações que visem a favorecer o acesso de todos os jovens aos bens culturais e aos espaços de fruição da cultura e do lazer através:
53
• da descentralização das alternativas culturais, promovendo espetáculos musicais, teatrais, de dança, e cinema nos bairros populares;
• da implantação da meia-entrada nos espetáculos comerciais, mesmo para os jovens que não são mais estudantes, ou da promoção de espetáculos gratuitos;
• da concessão de passe livre para jovens se deslocarem para espetáculos culturais;
• da implantação e conservação de praças e áreas de lazer nos bairros;
• do incentivo à prática de esportes diversos, tanto para os jovens como para as jovens;
• das condições para que os jovens possam expressar suas visões de mundo através da arte, de modo que possam se afirmar como produtores de bens culturais e artísticos, e não apenas consumidores;
• do apoio às experiências de participação juvenil em comunicação, especialmente nas rádios e jornais comunitários.
284. Na Segurança Pública e combate à criminalidade:
• exigir que seja implantada uma política de segurança que garanta a todos os cidadãos, em especial aos jovens moradores dos grandes centros urbanos, o direito de ir e vir;
• combater o tráfico de drogas, não apenas nos pontos de distribuição, mas em sua articulação como negócio internacional, que envolve a circulação de altas somas, lavagem de dinheiro e tráfico de armas;
• combater todas as formas de violência: física, simbólica, doméstica, policial;
• combater todas as formas de violência e abuso sexual;
• combater a prostituição infanto-juvenil;
• tornar posicionamento firme contra a proposta de redução da maioridade penal;
• pleitear o estabelecimento de uma política de segurança que combata a corrupção policial e garanta treinamento aos agentes de segurança pública na perspectiva dos direitos humanos.
• garantir os direitos da população carcerária, constituída em sua maioria por jovens;
• apoiar todas as ações que visem à difusão e implantação de uma cultura de paz.
285. Na Saúde e Assistência Social:
• promover vida saudável, através do acesso à alimentação de qualidade e à atividade física;
• garantir o acesso à informação para que a experiência da maternidade e da paternidade seja uma escolha consciente, quando os casais jovens se acharem maduros para esta responsabilidade, levando em conta a ética cristã;
• educar os jovens católicos para a castidade e para a responsabilidade no exercício da própria sexualidade, prevenindo-se, desta maneira, de doenças sexualmente transmissíveis;
• promover educação com vistas à prevenção do uso de drogas, com especial atenção às bebidas alcoólicas, consideradas drogas lícitas, responsáveis pelo envolvimento de jovens em situações que colocam em risco suas vidas (como acidentes de trânsito, brigas, afogamentos);
• dar atenção especial aos jovens que deixaram a escola e não estão inseridos no mercado de trabalho;
• garantir que os jovens em situação de risco social tenham acesso à assistência social adequada (jovens vítimas de violência doméstica e sexual; jovens em situação de rua; jovens que testemunharam crimes);
• garantir os direitos e a reinserção social dos jovens que se encontram em cumprimento de medidas sócio-educativas, especialmente daqueles que se encontram afastados do convívio familiar, nas chamadas casas de correção.
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286. Na participação:
• estimular a participação dos jovens em grupos, movimentos, organizações culturais, sociais e políticas;
• apoiar a constituição e acompanhar as atividades de conselhos de juventude em todos os níveis (municipal, estadual, nacional);
• colaborar na formulação, acompanhar a implantação e avaliar as políticas públicas de juventude, estimulando especialmente a participação dos jovens nestas atividades;
• colaborar para que as escolas se tornem espaços privilegiados de participação e de aprendizado democrático (através do estabelecimento de grêmios e de representações estudantis);
• contribuir para que os grupos religiosos, movimentos e pastorais sejam também espaços de formação para a cidadania, na medida em que possibilitam a consciência e a vivência dos direitos e deveres, e tornam-se ambiente de construção de pensamento crítico e democrático;
• acompanhar a discussão acerca do estabelecimento do Estatuto da Juventude, que está em tramitação no Congresso Nacional;
• acompanhar as comissões especiais e permanentes de políticas públicas de juventude que foram criadas no âmbito dos legislativos federais, estaduais e municipais;
• estimular a participação juvenil nas conferências estaduais e nacional de juventude.

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